As consequências do etarismo

editorial

 

O etarismo em questão. Por muito tempo, pessoas com mais de 50 anos eram consideradas idosas, não só inaptas para o trabalho, mas também para a rotina do dia a dia. Não raro, ouvia-se: meu pai envelheceu, fez 50 anos. Esse discurso mudou e o aumento da expectativa de vida foi indutor desse novo olhar. Hoje, até mesmo em organismos públicos, a aposentadoria mudou de patamar. No Supremo Tribunal Federal, ministros só deixam o posto compulsoriamente ao completar 75 anos.

No entanto, o mundo digital, especialmente, criou um novo cenário. Pessoas acima de 50 anos, que já não são mais os velhos de antigamente, esbarram no novo etarismo, por terem passado parte de suas vidas no cenário analógico. Como consequência, enfrentam dificuldades no mercado de trabalho até mesmo em situações que se mostram atualizadas.

A estagiária Mariana Souza, sob supervisão da editora Graciele Nocelli, foi às ruas e constatou que o envelhecimento da população expõe o etarismo no mercado de trabalho, paradoxalmente, num país que envelhece rapidamente. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) apontam que 70% dos trabalhadores com mais de 50 anos estão fora do mercado.

Trata-se de fato grave, por não levar em conta que o conhecimento não é algo que se esgota em determinada faixa etária. Mesmo com a fluidez dos novos tempos, nos quais as atualizações ocorrem com maior frequência, é possível estar adaptado aos novos tempos. O preconceito, pois, é uma forma de rejeição a esses personagens sem avaliar se estão aptos, ou não, para o mercado de trabalho.

A reportagem cita exemplos de pessoas próximas da terceira idade que atuam na ponta do mercado digital e são, a despeito do cargo, sistematicamente surpreendidas por atitudes que mesclam surpresa e rejeição por estarem em tal posição, como se fosse algo inatingível para sua faixa etária.

O gerontólogo José Anísio “Pitico” da Silva destaca, e com razão, que a cultura brasileira, em vez de reverenciar a velhice, como ocorre em algumas civilizações, como a japonesa, a exclui, anula e cria empecilhos para sua ascensão no mercado de trabalho. Como solução, defende uma revisão de diretrizes desse próprio mercado. Desde 1994, está em vigor a Política Nacional do Idoso, acrescida do Estatuto da Pessoa Idosa, datado de 2003.

Os dois documentos tratam de direitos das pessoas que ingressam na terceira idade, o que é importante, mas é necessária uma discussão mais ampla sobre as mudanças que estão em curso e as que estão por vir no mundo digital.

Ademais, a maioria dos idosos busca espaço no mercado de trabalho – mesmo tendo cumprido a sua jornada e se aposentado – em função da questão econômica. Uma parcela ainda é gestora financeira de suas famílias e o que recebem como aposentados ou pensionistas é insuficiente para o sustento.

O etarismo, porém, como também aponta Pitico, não está apenas no mercado de trabalho. Ele se revela nas ruas, na saúde, na educação e em outros espaços, fazendo os idosos párias na nova sociedade.

O que os demais não sabem é que, mais dia, menos dia, terão a sua vez de viver a mesma experiência. Afinal, o tempo não para.

 

 

O post As consequências do etarismo apareceu primeiro em Tribuna de Minas.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.