Lady Gaga: viagens de ônibus SP-Rio ficam até 400% mais caras; por que preços variam tanto?

Nas vésperas de feriados e eventos de grande porte, passagens de ônibus interestadual podem ter variações de preços que chegam a 400%. As diferenças ocorrem tanto devido a uma mudança de legislação vigente desde 2019 como a entrada da inteligência artificial no setor.

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A IstoÉ Dinheiro fez uma comparação com os preços das passagens de São Paulo para o Rio de Janeiro durante o final de semana após o dia 1º de maio. Além do feriado nacional na quinta-feira, 1, a cidade maravilhosa receberá um mega concerto gratuito da cantora Lady Gaga na praia de Copacabana, na noite do sábado, 3.

Também foram pesquisados os preços do mesmo trajeto no dia 31 de maio, um sábado sem feriado ou eventos de grande porte no Rio.

Os preços são para ônibus partindo da Rodoviária do Tietê, em São Paulo, logo após à meia-noite, uma faixa bastante procurada para o trajeto, pois é possível viajar durante a noite e chegar cedinho à cidade.

No dia 31 de maio, o preço mais baixo encontrado, na viação Água Branca, foi de R$ 89,90 para um ônibus semileito. As empresas 1001 e Expresso do Sul cobravam R$ 94,90 na mesma categoria. Já passagens nas categorias leito e leito-cama custavam R$ 249,90 na 1001.

Para o feriado de 1º de maio, uma quinta, todas as empresas anunciavam preços maiores. Passagens de ônibus nas categorias convencional, a mais simples de todas, apareciam por R$ 219,99 na Catarinense. A categoria semileito chegava a aparecer por R$ 459,90 na Águia Branca. Já a passagem leito aparecia por R$ 899,99 na mesma empresa.

Veja o comparativo de passagens nas duas datas, com horários aproximados*

Os valores são em reais e foram comparados na plataforma QueroPassagem. A reportagem de IstoÉ Dinheiro também consultou os preços diretamente na bilheteria das viações e também seguiam os valores da venda no site. Dados de outra plataforma de passagens, a Clickbus, apontam que as buscas por passagens no feriado chegaram a aumentar 521% após o anúncio do show de Lady Gaga, em relação às buscas feitas no final de semana anterior.

A reportagem procurou ao JCA, grupo responsável pelas viações 1001, Catarinense, Cometa e Expresso do Sul (todas realizam o trajeto rodoviário Rio-São Paulo) para um posicionamento. O texto será atualizado quando houver resposta.

Quando começou a tarifa dinâmica nas passagens de ônibus

A resolução nº 4770 de 25/06/2015 da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) mudou o modelo de operação das linhas de ônibus interestaduais dos regimes de concessão e licitação para autorização de exploração dos trajetos. A alteração possibilita, por exemplo, que múltiplas empresas explorem o mesmo trajeto. Também introduziu a possibilidade de precificação dinâmica desde o dia 18 de junho de 2019.

No entanto, foi a chegada da inteligência artificial nos últimos três anos que acelerou a transformação da precificação. Agora, as empresas podem atualizar os valores das passagens várias vezes ao dia, conforme ditam os robôs a partir da análise dos dados disponíveis.

“Em uma empresa de ônibus, antes o coração do negócio era veículo, motorista e escala. Hoje, as ferramentas de tecnologia e inteligência artificial estão completamente inseridas no negócio”, afirma a conselheira fiscal da Abrati (Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros), Leticia Pineschi.

Os motores de precificação levam em consideração fatores como demanda, concorrência e rotas possíveis para determinar preços e ônibus necessários. Modelos mais avançados analisam até a previsão do clima e eventos na localidade de destino.

Secretário-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiro (Anatrip), Gabriel Oliveira defende que as variações são necessárias para driblar problemas de caixa das empresas decorridos das gratuidades previstas em lei. “É uma forma que o setor encontrou para manter o equilíbrio financeiro e continuar operando com qualidade”, diz.

Passageiros e viagens também mudaram

Especialistas do setor dizem que as transformações tecnológicas acompanharam mudanças nas companhias e nos próprios usuários dos serviços.

Entre 2021 e 2024, a proporção de ônibus anunciados como leito e semileito cresceu 15%, enquanto executivos e convencionais reduziram de 83% para 61%.

“Hoje o usuário já está sendo uma pessoa com um melhor poder aquisitivo, que prefere viajar durante a noite dormindo, e faz mais viagens curtas”, diz o diretor da FGV Transportes, Marcus Quintella, que destaca a criação de serviços como “sala VIP” nas rodoviárias e programas de fidelidade.

Os passageiros também comparam mais preços. Pesquisa do Google indica que as buscas online dos brasileiros por turismo tiveram uma alta de 35% entre 2019 e 2024. O ônibus foi justamente o transporte favorito da maioria (74%), a frente do carro próprio (44%) e do avião (32%).

No transporte aéreo, a precificação dinâmica ocorre há décadas. A chegada da tecnologia ao setor viário, no entanto, segue mantendo os valores das passagens de ônibus competitivos, segundo Pineschi.

Em comparação com o avião, os ônibus possuem ainda uma capilaridade maior. Outra pesquisa do Google, feita em parceria com a ClickBus, mostra que a operação rodoviária conta com 6.800 destinos no país, que tem 5.700 municípios.

Legislação ainda cerceia abusos

Mesmo com a precificação dinâmica liberada, as empresas ainda devem seguir um cálculo de preços definido ainda por uma resolução da ANTT (nº 4770), que regulamenta o transporte rodoviário de passageiro. A definição do preço máximo é resultado de uma fórmula que inclui preço dos combustíveis, a inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) e o coeficiente do ano anterior.

Pineschi afirma que hoje nenhuma empresa pratica a tarifa máxima no mercado. “A política mais inteligente é fazer preços diferentes em diferentes canais, visando uma maior ocupação. Até porque, hoje a gente tem também o balanço ESG, que é perceber que o ônibus vazio, além de não ser rentável, é ecologicamente péssimo”, diz.

Caso o passageiro suspeite de prática abusiva, no entanto, pode fazer uma denúncia à agência reguladora. “É fundamental que os casos sejam comunicados para que a ANTT possa tomar as medidas cabíveis em relação às empresas de transporte”, afirma a entidade em nota. É possível também registrar queixa em órgãos de defesa do consumidor.

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