
O BC (Banco Central) divulgou estudos sobre o crédito em fevereiro e uma discrepância salta aos olhos: quem busca crédito imobiliário ou rural paga juros médios de 11% ao ano, enquanto o empréstimo pessoal atinge 43%. A diferença gritante leva a questionar o monopólio alcançado pelos ‘Big Banks’ e sua influência nas altas taxas de juros no Brasil.
Em fevereiro, o estoque total de crédito com recursos livres chegou a R$ 3,7 trilhões, registrando estabilidade em relação ao mês anterior e alta de 11,3% em doze meses.
Apesar do crescimento, a diferença entre as modalidades de crédito chama atenção, visto que, enquanto empresas acessam recursos com juros médios de 23,9% ao ano, consumidores enfrentam taxas que ultrapassam os 43%.
A concentração bancária é um dos fatores frequentemente citados para explicar esse descompasso. Hoje, cinco instituições financeiras dominam cerca de 60% do mercado de crédito, depósitos e ativos no país.
Ao BP Money, Eduardo Gribler, gestor da AMW Asset, afirma que esse domínio gera um efeito claro: “A concentração é uma realidade inegável, com cinco maiores bancos controlando grande parte do mercado. Isso afeta diretamente a dinâmica do crédito no Brasil”.
Crédito e concentração bancária no Brasil
A concentração bancária tem consequências diretas para quem busca crédito, especialmente pessoas físicas e pequenas empresas. Bruno Corano, economista da Corano Capital, compara o cenário brasileiro com o dos EUA.
“Lá, como existem muitos bancos pequenos, a competição por empréstimos é enorme. Isso reduz os spreads e torna o crédito mais acessível”, explica.
Segundo o especialista, quanto maior a instituição, maiores também os custos operacionais — o que reduz o incentivo à competição.
No Brasil, a baixa competição também afeta a diversificação de produtos financeiros. “A concentração não incentiva o microcrédito, por exemplo, que já demonstrou bons resultados em experiências voltadas à redução da pobreza e da desigualdade”, observa Gribler.
Além disso, o custo do crédito no país é pressionado por outros fatores, como alta inadimplência e carga tributária.
Eduardo Gribler destaca a recuperação de crédito como um ponto sensível na discussão. “A baixa taxa de recuperação é um grande diferencial negativo. Isso aumenta o risco e, por consequência, o custo do empréstimo”, afirma.
Menor crédito, maior desigualdade
O impacto da concentração bancária não se limita ao crédito. Ele ecoa também no crescimento econômico e na distribuição de renda. Embora Corano não veja uma correlação direta entre concentração e crescimento, reconhece que o crédito caro restringe investimentos e consumo.
“Com menos crédito, o crescimento econômico desacelera. E com menos crescimento, a desigualdade tende a aumentar”, afirma.
O modelo bancário brasileiro, portanto, enfrenta um paradoxo: apesar de sólido e resistente a crises, ele continua inacessível para boa parte da população.
E enquanto os “Big Banks” dominam o cenário, a democratização do crédito — fundamental para o desenvolvimento econômico — segue como um desafio em aberto.
Limites do BC para frear os ‘Big Banks’ com a política antitruste
Apesar de ser o principal regulador do setor, o Banco Central tem instrumentos limitados para interferir diretamente na disparidade entre o crédito direcionado (com juros controlados) e o crédito livre.
Bruno Corano argumenta que o foco deveria estar em facilitar a entrada de novas instituições no mercado, aumentando a competição.
“Não existem instrumentos monetários que corrijam essa disparidade. Mas é possível promover mais liquidez para pequenos bancos entrarem no jogo”, diz.
Modelos econométricos, como painéis de dados ou equações simultâneas, podem ser utilizados para avaliar até que ponto a concentração afeta os juros.
Ainda assim, segundo os especialistas, os dados apontam que a estrutura bancária atual favorece a manutenção de taxas elevadas e dificulta o acesso ao crédito por parte de empresas menores.
Big Techs: solução ou desafio?
Com a digitalização do setor financeiro, as Big Techs podem mudar esse cenário? Para Corano, é improvável.
“Se fosse para acontecer, já teria acontecido. As Big Techs entendem que o setor bancário exige uma expertise muito diferente do core delas. É um negócio complexo, regulado e com margens estreitas”, argumenta.
Gribler, por outro lado, vê um ponto de atenção: “Com a entrada das Big Techs, o risco sistêmico muda de natureza. O Banco Central precisa ficar atento à capilaridade dessas plataformas e aos desafios regulatórios que elas trazem”.
A velocidade com que essas empresas crescem — sem uma regulação que acompanhe — pode gerar novos desequilíbrios no sistema financeiro.
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