São inúmeras as situações que podem levar um empresário a considerar a venda do seu negócio. Aposentadoria sem herdeiros aptos à sucessão, dificuldade para manter a competitividade no mercado, limitações financeiras para saldar dívidas ou até mesmo o recebimento de uma proposta atrativa de terceiros estão entre as razões mais comuns. Períodos de instabilidade, marcados por juros altos, moeda fraca e perspectivas incertas, levam muitos empresários a cogitar a venda dos seus negócios…
Profissionais que atuam no mercado de fusões e aquisições (“M&A” em inglês) sabem que a venda de um negócio não é simples. Trata-se, quase sempre, de uma operação mais complexa e demorada do que o vendedor espera. Por isso, ao tomar essa decisão, é essencial que o empresário invista tempo na elaboração de uma estratégia de venda bem estruturada, antes mesmo de colocá-la em prática. Além disso, é altamente recomendável que ele contrate, com a máxima antecedência, assessoria jurídica e financeira especializada. A atuação de profissionais experientes é decisiva não apenas para reduzir o risco de insucesso — infelizmente bastante comum —, como também para acelerar as etapas do processo.
Ao iniciar uma venda, o empresário precisa determinar o que quer ou pode vender. Afinal, ninguém conhece melhor o negócio do que o próprio dono, o que o coloca em posição privilegiada para avaliar quais ativos ou parcelas da empresa podem ser mais atrativos para potenciais compradores. Muitas vezes, a própria definição do que será o alvo da compra e venda demandará a atuação de um assessor financeiro que – com a objetividade de um olhar “de fora” – auxiliará na determinação do que é mais valioso no negócio. Esse profissional pode também sugerir a exclusão de partes menos atrativas do escopo da transação, realizar a avaliação do valor do ativo (valuation) e, após a devida prospecção de mercado, selecionar os compradores potenciais, podendo, inclusive, organizar um processo competitivo privado, com regras próprias, caso haja mais de um interessado. É essencial que o vendedor conheça o valor do que pretende negociar com base em critérios técnicos, especialmente porque o comprador também utilizará métodos de avaliação estruturados.
O alvo da transação pode ser apenas uma parte – majoritária ou minoritária – do capital da empresa. Em alguns casos, a venda pode ser motivada por pressão regulatória, como no caso das empresas de apostas (bets) que não podem ter capital exclusivamente estrangeiro. Em vendas parciais, as partes deverão negociar um Acordo de Sócios, a ser assinado quando do fechamento, estabelecendo as bases para a convivência futura entre vendedor e comprador, agora como sócios.
Uma vez delimitado o alvo da operação, novas providências se impõem ao vendedor, entre elas a valorização estratégica do negócio, com vistas a torná-lo mais atrativo. Isso inclui a resolução de pendências — por meio de acordos ou parcelamentos —, a regularização de eventuais inconsistências, como licenças governamentais ausentes, e o ajuste do escopo da venda, com a retirada de ativos que não integram o negócio principal (carve-out), como imóveis ociosos ou subsidiárias inativas. Também pode ser necessário revisar a estrutura societária do grupo vendedor, a fim de otimizar os efeitos tributários da operação. Todas essas medidas devem contar com o acompanhamento de assessoria jurídica especializada, inclusive nas fases subsequentes.
Com as bases da negociação alinhadas, recomenda-se que as partes as formalizem numa carta de intenções, a ser assinada por ambas, delineando as principais condições da compra e venda: alvo da venda, preço ou faixa de preço, prazos para as próximas etapas, entre outros pontos relevantes. Em geral, a carta de intenções tem caráter não-vinculante, com exceção de algumas cláusulas – como a que assegura a exclusividade ao comprador signatário para negociar com o vendedor, e a que reafirma a confidencialidade de informações disponibilizadas sobre o negócio-alvo pelo vendedor, ao comprador.
A assinatura da carta de intenções inaugura a fase de auditoria multidisciplinar (due diligence), na qual o vendedor apresentará toda a documentação e os dados necessários para que o comprador confirme se o negócio corresponde, de fato, às expectativas que motivaram a proposta. Essa fase inclui análises, pelo comprador e seus assessores, sob vários aspectos – inclusive operacional, contábil-financeiro, comercial, jurídico, sistêmico (TI), regulatório, de recursos humanos, “valuation”, entre outros.
As conclusões da auditoria podem levar à (re)negociação de condições da transação, como o preço (que pode ser diminuído por conta de erros contábeis ou da constatação de contingências e riscos sem provisionamento), condições antes do fechamento (aprovação prévia do CADE ou obtenção de licenças), entre outras regularizações. Se for o caso, esses pontos deverão ser abordados no contrato de aquisição a ser negociado entre as partes.
Em geral, a venda de um negócio não se dá com “porteira fechada” (com poucas exceções) e, por isso, o vendedor fica responsável por indenizar o comprador por passivos não contabilizados que surjam após o fechamento, mas que resultem de atos ou omissões da administração pré-fechamento. Caberá ao vendedor e aos seus advogados negociarem limites (especialmente, valor e prazo máximos) à sua obrigação contratual de indenizar o comprador por passivos decorrentes da gestão pré-fechamento.
As cláusulas de indenização compõem parte importantíssima do contrato de aquisição. Junto com o escopo e a logística de indenização, esse contrato também conterá uma série de declarações do vendedor (“R&W”) sobre a situação da sociedade ou do negócio-alvo, sob vários aspectos (inclusive financeiro, jurídico, etc.), na data do fechamento, que – caso se revelem inverídicas após o fechamento – poderão embasar a indenização do comprador pelo vendedor.
Embora cada operação tenha suas particularidades, é comum que o contrato de aquisição contemple – além da indenização – as formalidades de fechamento (ou seja, da transferência do negócio-alvo), forma de pagamento do preço, condições prévias ao fechamento, obrigação de não-concorrência e não-aliciamento (se for o caso), entre outros pontos.
O sucesso de uma operação de venda depende, em grande medida, da preparação adequada do vendedor, da qualidade dos assessores envolvidos e da condução cuidadosa das etapas jurídicas e negociais. Vender uma empresa é mais do que realizar um bom negócio: é fechar um ciclo com segurança e abrir espaço para novas possibilidades, sem deixar riscos relevantes pelo caminho.
* Alberto Mori, sócio do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, é especialista em fusões e aquisições (M&A) e direito societário
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