O Discord chegou ao noticiário brasileiro em meio a investigações criminais e pedidos para que a Justiça suspenda sua operação no Brasil. As acusações apontam a plataforma como um ambiente propício para o planejamento e execução de crimes. No entanto, sua origem e propósito possui objetivos bem menos obscuros.
Fundado em 2015, o Discord é uma plataforma de troca de mensagens em texto, áudio e vídeo. É muito utilizado para transmissões de voz sobre IP (compartilhamento da imagem da tela com uma narração por cima).
Seus fundadores, Jason Citron e Stanislav Vishnevskiy, criaram a plataforma nos Estados Unidos para ajudar equipes de jogos online a se comunicar durante as partidas sem precisar pausar, de modo a facilitar estratégias em games em tempo real.
Com uma conta na plataforma, é possível conectar-se a “servidores”, um tipo de comunidade dentro da qual será possível trocar mensagens, conversar em tempo real por áudio ou vídeo e compartilhar a tela do computador e do celular. Existem servidores públicos, acessíveis para qualquer um com uma conta, e outros com configurações de privacidade restritas. Assim, é possível criar até mesmo grupos “secretos”, encontrados apenas por convite.
Com o tempo, os temas dos servidores foram além dos video games. Hoje, segundo números da plataforma, são mais de 200 milhões de usuários, dos quais 93% jogam, porém há comunidades focadas nos mais diversos assuntos, como músicas, filmes, criptomoedas, inteligência artificial, ou apenas para interação entre os usuários.
A plataforma ainda não possui capital aberto em bolsa de valores, apesar de executivos da empresa já terem discutido em público um possível IPO. A empresa tampouco deixa público dados sobre sua receita, que vêm principalmente da venda de assinaturas para versões premium da plataforma.
Crimes pelo Discord
A disputa em torno da plataforma surge devido a notícias de grupos que se articulam na plataforma para cometer crimes. Recentemente, uma operação da policia civil do estado do Rio de Janeiro acusou um conjunto de usuários da plataforma de organizar ataques terroristas que seriam realizados durante o show gratuito da cantora Lady Gaga na praia de Copacabana.
Não foi a primeira vez que a plataforma foi associada a ações criminosas. Outra investigação, da policia civil do estado de São Paulo, afirma que uma adolescente de 15 anos realizou uma transmissão ao vivo em janeiro de 2025 na qual praticava automutilação, estimulada por uma audiência virtual de quase 50 pessoas. O episódio não seria isolado: outros semelhantes ocorreriam, muitas vezes com meninas sob chantagem de ter fotos íntimas vazadas.
No mês de abril, mais uma investigação, no Rio de Janeiro, afirmou ter impedido um grupo que planejava matar uma pessoa em situação de rua e transmitir a cena pela plataforma.
O que diz a empresa
Em nota enviada à IstoÉ Dinheiro, o Discord afirma que “nossas políticas em relação a conteúdos nocivos, sistemas de detecção proativa e parcerias com organizações de proteção à infância demonstram nosso compromisso inabalável com a segurança dos usuários”.
A nota da empresa inclui uma longa lista de ações tomadas para melhorar sua moderação de conteúdo. Confira na íntegra ao final deste texto. Veja mais abaixo.
Pedidos de suspensão da plataforma
O deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) protocolou no Ministério Público Federal um pedido para que a operação do Discord seja suspensa no Brasil, de modo semelhante ao que ocorreu com o X (antigo Twitter) em 2024. O motivo seria o mesmo: a ausência de representação da empresa no país, para responder inclusive na esfera criminal.
Outro pedido semelhante foi protocolado pelo deputado federal Reimont (PT-RJ), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. “É inadmissível que conteúdos de ódio continuem a circular livremente nessas plataformas e elas permaneçam isentas”, publicou o parlamentar em uma rede social, que também pede a suspensão do fórum virtual 4Chan.
Em janeiro, o governo federal chegou a tentar uma reunião com empresas de tecnologia para discutir a moderação de conteúdo dentro das plataformas. O Discord estava entre os convidados, ao lado do Google e Youtube, Kwai, LinkedIn, Meta, TikTok e X (antigo Twitter). Nenhuma das empresas compareceu.
Veja na íntegra a nota do Discord
“O Discord foi criado para pessoas que gostam de se divertir e jogar com os amigos. Estamos preocupados com a forma equivocada como nossa plataforma tem sido retratada como insegura e não apoiamos qualquer uso indevido dela. Há anos investimos fortemente em ferramentas de segurança e sistemas de moderação líderes no setor, que protegem nossos mais de 200 milhões de usuários ao redor do mundo. Nossas políticas em relação a conteúdos nocivos, sistemas de detecção proativa e parcerias com organizações de proteção à infância demonstram nosso compromisso inabalável com a segurança dos usuários. Discordamos da posição do parlamentar que o Discord deveria ser suspenso e estamos à disposição para compartilhar mais com ele sobre os diversos casos em que colaboramos ativamente com as autoridades brasileiras na identificação de pessoas que representavam riscos no mundo real. Estamos prontos para trabalhar com as autoridades na construção de soluções proporcionais que abordem preocupações específicas sem comprometer a liberdade digital.”
INFORMAÇÕES DE CONTEXTO
- O Discord vem cooperando com as autoridades, em conformidade com a lei, em diversas operações recentes, incluindo a Operação Fake Monster. Nossas ações proativas, em alguns casos, ajudaram a impedir crimes antes que ocorressem e contribuíram para a prisão de indivíduos mal-intencionados. Continuamos tendo conversas produtivas com as autoridades brasileiras, com resultados positivos dessa colaboração.
- Cooperamos ativamente com as autoridades em nível federal, estadual e municipal, incluindo o fornecimento de orientações e treinamentos sobre como enviar solicitações, garantindo agilidade nas respostas e eficiência nas investigações.
- Mantemos um diálogo contínuo com as autoridades brasileiras.
- Nossa parceria com o Ciberlab oferece treinamentos especializados para policiais e promotores brasileiros:
Mais de 1.000 profissionais já foram capacitados, sendo que a sessão mais recente, realizada em março deste ano, contou com a participação de mais de 70 policiais e promotores. - Enquanto mantemos uma colaboração ativa e contínua com autoridades brasileiras, incluindo diversas sessões de treinamento, também estamos comprometidos em expandir essa parceria com demais autoridades do país.
- Nossas ações proativas às autoridades brasileiras já resultaram em prisões confirmadas e na prevenção de atividades criminosas.
- Nos reunimos com autoridades de alto escalão do Ministério da Justiça e da Presidência da República.
- Também temos nos engajado com a sociedade civil e especialistas por meio de iniciativas como:
– Apoio ao programa educacional com influenciadores conduzido pelas Redes Cordiais em parceria com o Ministério da Justiça.
– Colaboração com a Vita Alere no desenvolvimento de materiais de apoio para administradores e moderadores de comunidades de jogos, incluindo um workshop que realizamos recentemente com as principais comunidades gamer do Brasil.
– Realização de uma sessão fechada com especialistas em saúde mental para compartilhar experiências sobre comunidades extremistas e obter feedback sobre nosso trabalho preventivo. - Ao longo do último ano, o Discord ampliou significativamente seu investimento no Brasil, incluindo:
– Contratação de equipe dedicada ao mercado brasileiro;
– Parcerias com agências locais para desenvolvimento de políticas públicas e relacionamento com a imprensa;
– Implantação de equipes especializadas em identificar e remover conteúdos nocivos específicos da região;
– Oferta de recursos e treinamentos para autoridades de segurança pública, com foco nas prioridades específicas do Brasil. - Sabemos que o mau uso de plataformas online por pessoas mal-intencionadas é um desafio complexo, que exige soluções colaborativas.
– O Discord possui Diretrizes da Comunidade robustas, que definem as regras que todos os usuários devem seguir. Essas diretrizes se aplicam a todas as partes da plataforma.
– Mantemos nossa política de tolerância zero para atividades ilegais, que não têm espaço na nossa plataforma nem na sociedade, e adotamos uma abordagem global para lidar com problemas e preocupações.
– Atuamos de forma proativa para identificar e remover usuários e espaços que estejam associados a atividades prejudiciais. Quando tomamos conhecimento de conteúdo que viola nossas políticas, aplicamos as medidas cabíveis, o que pode incluir o banimento de usuários e a derrubada de servidores.
– Desenvolvemos ferramentas avançadas de segurança automatizada, que monitoram proativamente a presença de conteúdo exploratório.
– Nossa iniciativa de Assistência à Segurança do Adolescente inclui recursos projetados especialmente para proteger usuários mais jovens, como alertas de segurança e filtros de conteúdo sensível, que são ativados por padrão para adolescentes.
– Reportamos proativamente casos que representem risco iminente de morte ou lesão corporal grave e buscamos colaborar com as investigações das autoridades brasileiras sempre que apropriado e em conformidade com a legislação.
– Somos membros fundadores do ROOST, iniciativa que oferece ferramentas gratuitas e de código aberto para a detecção de material prejudicial.
– O Discord desenvolveu um novo modelo para detecção de formas inéditas de CSAM (material de abuso sexual infantil) e disponibilizou essa tecnologia em código aberto, porque acreditamos que recursos que promovem a segurança online não devem ser uma vantagem competitiva de uma única empresa, mas devem ser compartilhados para o bem comum.
– Como parte dos esforços do setor, o Discord também apoia a iniciativa Lantern, um programa inédito de compartilhamento de sinais entre empresas, que busca aprimorar e fortalecer a detecção de tentativas de exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes online.
– Trabalhamos com especialistas do setor, como a Redes Cordiais, o Instituto Vita Alere, além da Internet Watch Foundation e da INHOPE, para tornar o ambiente online mais seguro para jovens e suas famílias. - Sobre moderação de conteúdo:
Discord adota três frentes principais para moderação de conteúdo na plataforma:
– Moderação da Plataforma: As Diretrizes da Comunidade do Discord se aplicam a todo conteúdo e a todas as interações dentro da plataforma. Essas regras fundamentais são aplicadas de forma contínua, por meio de uma combinação de ações proativas e reativas realizadas pelo Discord.
– Moderação da Comunidade: Os administradores de servidores e moderadores voluntários definem e aplicam normas de comportamento adicionais nas suas comunidades, que podem ir além das Diretrizes da Comunidade do Discord, mas nunca contrárias. Oferecemos a esses moderadores tecnologia de apoio (como a ferramenta AutoMod), além de treinamentos e suporte entre pares. Em 2023, aprimoramos a caixa de ferramentas dos moderadores da plataforma, oferecendo novos recursos que permitem identificar de forma proativa atividades potencialmente perigosas, como ataques coordenados a servidores (raids) e envio de spam por mensagens diretas (DM spam) e agir rapidamente quando necessário.
– Controles do Usuário: A arquitetura do Discord oferece a cada usuário o controle sobre sua própria experiência na plataforma, incluindo com quem se comunica, que tipo de conteúdo deseja ver e em quais comunidades participa ou cria.
O post Discord: como funciona e por que a plataforma virou alvo de pedido de bloqueio no Brasil apareceu primeiro em ISTOÉ DINHEIRO.