Pode não parecer, mas Vingadores: Era de Ultron está completando 10 anos nesta semana. Lançado em 1º de maio de 2015 nos EUA, o filme chegou ao Brasil uma semana antes, em 23 de abril do mesmo ano. Na época, o longa era cerca de expectativas, não apenas pelo sucesso de Os Vingadores (2012), mas também porque os filmes lançados em 2014 (Capitão América: O Soldado Invernal e Guardiões da Galáxia) haviam elevado muito o nível da Marvel ante o cinema num geral. Diferentemente do primeiro filme, era a primeira vez que a Marvel chegava a um grande lançamento em um ano de longas embalados praticamente só por críticas positivas.
Para completar o nível de ansiedade, já era falado na época que o público vivia uma certa ‘fadiga’ de filmes de super-heróis, então seria necessário que todos os filmes dali em diante ousassem com tons e temáticas diferentes. E o lançamento do primeiro trailer, mais voltado para um tom sombrio, fez com que o público imaginasse que veria uma aventura mais densa e sombria envolvendo os heróis mais poderosos da Terra.
E havia motivos para esperar algo mais sombrio. A começar pelo nome do filme, que era o mesmo da primeira grande saga do Marvel Now!, o evento que mudou completamente o Universo Marvel nos quadrinhos durante o lançamento do primeiro filme dos Vingadores. O público inicialmente estranhou que o longa fosse adaptar uma saga tão recente (2013), mas como ela abordava uma história repleta de viagens temporais, na qual o robô Ultron venceu os Vingadores e dominou o planeta. Em seu mundo perfeito, ele colocou seus robôs para vasculharem o mundo, enquanto os heróis tiveram de se esconder para formar resistências. Apesar de nem ser uma saga tão boa assim, havia elementos ali que pareciam bons para serem adaptados no cinema.
Além disso, anunciaram que James Spader, que estava no auge com a série The Blacklist, daria voz ao Ultron. Ter um ator desse peso e com uma voz tão marcante para interpretar o vilão foi um baita chamariz para diferentes públicos. E por vir de um personagem que lidava diretamente com espionagem e caça a criminosos, parecia que ele se adaptaria bem a essa possível trama do robozão dominando o mundo e caçando os heróis por aí. O que também casava com os novos trailers, que mantiveram o tom mais sóbrio, quase sem nenhuma piadinha e com cenas do Hulk descontrolado.
Houve também uma série de rumores, lançados pelos famosos insiders, que acabaram mexendo diretamente com as expectativas dos fãs. Pois é, faz tempo que os caras fazem isso. O primeiro deles falava que o Homem-Formiga, que também teria um filme lançado naquele ano, poderia ser introduzido em Vingadores 2. Porém, o rumor seguinte já desmentiu isso ao dizer que o Ultron teria sua origem dos quadrinhos mudada, sendo criado pelo Homem de Ferro em vez do Homem-Formiga. Curiosamente, esse rumor foi concretizado, causando um verdadeiro chororô nos fãs. Era meio engraçado ver gente que nunca tinha se importado com o Ultron ou com o Homem-Formiga xingando horrores na internet por conta de filme.
Também surgiu um rumor de que um Vingador morreria no filme. E aí começaram a criar ainda mais uma expectativa de um filme muito dramático, também apostaram que seria o Gavião Arqueiro (Jeremy Renner) que morreria. Acabou que até morreu alguém, mas foi o Mercúrio (Aaron Taylor-Johnson), que tinha acabado de se tornar um Vingador. Falando sobre os gêmeos, também surgiu o rumor de que eles seriam a introdução dos X-Men no MCU, sendo a Wanda (Elizabeth Olsen) peça fundamental para a introdução do Magneto, que supostamente faria uma ponta neste filme. Com esses caras enchendo a cabeça dos fãs de teorias disfarçadas de notícias, não tinha como o pessoal não jogar as expectativas lá para cima.
Aí, vieram as notícias sobre as refilmagens e a comoção foi geral. Apesar de ser algo extremamente comum nos cinemas, as notícias sobre as refilmagens passaram a ser dadas com uma conotação negativa, deixando os fãs com um pé atrás quanto ao filme. Inclusive, pessoas que viram o primeiro corte do longa relatam que o ato final foi todo remodelado, já que a primeira versão traria os capangas do Ultron se unindo para formar um Ultron Gigante, que enfrentaria todos os Vingadores ao mesmo tempo. Esse boato foi tratado como rumor por muitos anos, até que a própria Marvel lançou uma arte conceitual nos arquivos da Saga do Infinito que mostrava os heróis enfrentando esse Mega Ultron.
Ou seja, não é absurdo dizer que Era de Ultron foi responsável por moldar muito dos problemas da mídia na cobertura desses filmes. Foi a partir das repercussões positivas, que traziam muitos números para sites e canais de YouTube, que as teorias passaram a tomar conta das produções de conteúdo, que qualquer espirro flagrado nos sets passou a repercutir, e esse exagero de que tudo da Marvel é muito bom ou muito ruim, não havendo um meio termo, se consolidou.
Mais do que a imprensa, a Era de Ultron foi o que costumo chamar de “filme estrutural”. Mesmo não cumprindo as expectativas de todos os fãs e das milhões de teorias que cercaram o longa, ele estabeleceu subtramas que viriam a ocasionar os principais eventos do Universo Cinematográfico Marvel. Foi neste filme que se intensificou o racha entre o Capitão América e o Homem de Ferro. Além disso, o ato final é o grande causador do registro do Tratado de Sokovia, que divide os heróis do MCU, culminando no Capitão América: Guerra Civil (2016).
Ele introduz a Wanda e o Visão (Paul Bettany), cuja relação foi trabalhada nos próximos dois filmes dos Vingadores, na série WandaVision (2021) e em Doutor Estranho no Multiverso da Loucura (2022). Também inseriram uma Joia do Infinito na testa do Visão, fazendo dele uma desculpa para a vinda de Thanos (Josh Brolin) para a Terra. Falando nas Joias, elas são mencionadas por Heimdall (Idris Elba) em uma conversa com Thor (Chris Hemsworth), que termina o filme indo para o espaço, assim como o Hulk (Mark Ruffalo), que desaparece no Quinjet, dando início a Thor: Ragnarok (2017). Ou seja, é uma aventura que serviu como estrutura para praticamente toda a Fase 2 e a Fase 3 da Marvel. Pode não ser um dos filmes favoritos do público, mas são pouquíssimos os filmes de maior relevância para o sucesso da Marvel do que esse.
No fim das contas, por mais que não seja um filme realmente denso ou sombrio, ele consegue dar prosseguimento aos eventos do universo e diverte bastante. A relação entre os personagens é muito bem trabalhada e até mesmo o Ultron, que é bem diferente dos quadrinhos, tem seus momentos de brilho.
É uma aventura interessante, com seus erros e acertos, que serviu a um “propósito maior” e ainda angariou mais de US$ 1.4 bilhão. Ou seja, do ponto de vista comercial, foi um sucesso daqueles para a Marvel, que entendeu que até mesmo seus filmes de críticas mistas tinham potencial para romper a marca do bilhão, então poderiam ter investimentos maiores sem tantas preocupações. Do ponto de vista artístico, foi apenas mais uma aventura sem grandes brilhos dos Vingadores. O famoso entretenimento sem muito propósito, mas eficaz.