Crítica livre de spoilers.
Já faz um bom tempo desde que Hollywood vem investindo esforços em produções inspiradas em videogames. Apenas nos últimos anos, diversas adaptações chegaram aos cinemas e à televisão, incluindo a trilogia ‘Sonic’, o recente ‘Minecraft’ e a aclamada série ‘The Last of Us’. E, enquanto boa parte dessas releituras audiovisuais costumam decepcionar o público e a crítica por não se manterem fiéis à essência das obras originais, algumas conseguem desviar do comodismo e da presunção e cumprir com a ideia de se transformar em um bom entretenimento – como é o caso de ‘Until Dawn: A Noite do Terror’.
Supervisionado pela Sony Pictures, a atração é inspirada no game homônimo lançado pela PlayStation em 2015, mas afasta-se por completo da história que conquistou fãs ao redor do mundo para apresentar um terror de sobrevivência bastante familiar e que tem como principal objetivo nos envolver ao longo de pouco mais de uma hora e meia. O resultado do projeto, ainda que não apresente nada de novo ao gênero, é aprazível dentro de seus próprios limites, contando com boas atuações e uma mitologia ambiciosa que, mesmo escorregando em explicações complexas demais para serem levadas a sério, funciona em uma praticidade condizente a todos os nomes envolvidos no filme.
A trama acompanha Clover (Ella Rubin), uma jovem que resolve trilhar o mesmo caminho que a irmã Melanie (Maia Mitchell) fez antes de desaparecer – acompanhada de seus amigos mais próximos para tentar encontrá-la ou ao menos entender o que, de fato, aconteceu. Minada pela recente morte da mãe e se sentindo abandonada após Mel decidir sair de casa, Clover se mostra determinada a garantir que sua única família restante não a tenha deixado para sempre, chegando ao misterioso povoado de Glore’s Valley e percebendo que nada poderia tê-la preparado para o perigo que enfrentaria.
Fugindo de uma tempestade ao lado de Max (Michael Cimino), Nina (Odessa A’zion), Megan (Ji-young Yoo) e Abel (Belmont Cameli), Clover e os outros chegam a um misterioso casarão que parece estar no centro de uma anomalia climática que o protege da chuva torrencial em uma espécie de “olho de furacão”. Após resolverem se abrigar e esquadrinhar um plano para continuar procurando Mel e voltar para casa, eles se tornam alvo de um serial killer mascarado que tira a vida de cada um deles – apenas para voltarem ao momento em que chegaram no casarão em um looping temporal infinito do qual não conseguem escapar, a não ser que consigam sobreviver até o amanhecer.
Dirigido por David F. Sandberg, o longa-metragem é livremente inspirado na narrativa do game original, mas transforma-se em um horror sci-fi que se afasta das explorações do efeito borboleta do jogo – trazendo uma mistura divertida de incursões slasher, sobrenaturais e gore que não se leva a sério e que funciona justamente por esse motivo. Sandberg, que não é nenhum novato no gênero (considerando seu trabalho em ‘Quando as Luzes se Apagam’ e ‘Annabelle 2: A Criação do Mal’), puxa elementos de sua filmografia para trabalhar algumas cenas, deixando que os ótimos atores brilhem em meio a instáveis holofotes que não conseguem acertar em todas as sequências, mas ao menos tentam se desvencilhar dos clichês.
Uma interessante escolha de Sandberg é garantir que a história não seja entregue de uma vez aos espectadores, permitindo que os espectadores se engolfem em uma crescente confusão que, pouco a pouco, começa a fazer sentido: Clover e seus amigos, ao voltarem à vida, são confrontados por um novo pesadelo que se alimenta de seus próprios medos, mais especificamente da tórrida e desequilibrada mente da protagonista, que é forçada a enfrentar demônios de um passado não muito distante como se fosse um ratinho de laboratório, escolhida a dedo por um sádico psicopata. Dessa maneira, os obstáculos que enfrentam são materializações de traumas que querem destruí-los por completo e transformá-los em sórdidas criaturas movidas pela total desesperança.
O projeto não é livre de erros, principalmente nas elipses que promove com a chegada do segundo ato, manchando o ritmo e transformando o enredo em um monótono compilado de tropos repetitivos. Todavia, o comprometimento do elenco é forte o suficiente para nos entreter e nos deixar sobressaltados aqui e ali, nos instigando através de atuações fortes e que correspondem aos arquétipos que representam – nutrindo de uma química sólida e de projeções cômicas que ajudam a dar dinamismo à atmosfera.
‘Until Dawn: Noite do Terror’ funciona dentro dos limites impostos pelas próprias fórmulas do gênero e, no geral, nos diverte com uma história descompromissada e despojada. Apesar de nutrir apenas de breves elementos em relação ao game original, essa livre adaptação cumpre com o prometido, mesmo que permeado por algumas falhas.
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