Luiz Fernando Furlan foi ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no governo Lula entre 2003 e 2007, ocupando a pasta que hoje é liderada pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços -MDIC). Talvez por isso opine com naturalidade sobre a posição do Brasil em meio a guerra tarifária iniciada pelos EUA.
“Alckmin está certo. A melhor coisa que o Brasil pode fazer é ficar quieto”, afirma Furlan
O ex-ministro se refere ao posicionamento do Brasil em relação ao tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump para produtos de importados que chegam aos Estados Unidos. Desde quando as tarifas estavam no mundo das promessas, o vice-presidente vem falando “negociar”, e optou pela não-retaliação após elas terem sido anunciadas.
+ China diz que eventual nova elevação de tarifa pelos EUA ‘se tornará piada na história’
As tarifas recíprocas impostas ao Brasil ficaram no patamar “básico” de 10% quando oficializadas, em 2 de abril, o patamar mínimo.
Até o momento da publicação desta reportagem, o cenário é de uma pausa parcial temporária por 90 dias, desde o dia 9 de abril, nas tarifas recíprocas, com a taxa reduzida a 10% para todas aqueles países não retaliaram as tarifas americanas. Já a China está lidando com uma tarifa de até 245% para seus produtos nos EUA e aplicando 125% aos produtos americanos, após uma sequência de retaliações ao longo das últimas semanas.
Em entrevista à IstoÉ Dinheiro, Furlan diz que “Geraldo, com toda a calma e a diplomacia que ele tem, não fala bobagens”. Assim, favorecendo também o país em outras frentes, pois temos, segundo ele, “duas ou três oportunidades importantes por esse ano”, se referindo à presidência do Brasil em 2025 do encontro do Brics (grupo dos países emergentes), presidência do Mercosul, e, claro, anfitrião da COP30.
“É bom ficar calmo. Efetivamente, o Brasil não deve replicar, taxar produtos americanos, vamos ficar quietos. E vamos nos beneficiar do que aconteceu”.
Apesar de “bastante incerto e caótico o momento de Trump na presidência dos EUA e sua política de tarifas”, como ele define cenário econômico global atual, o ex-ministro diz que “não está pessimista”.
“Tudo somado, temos mais vantagens que desvantagens nas medidas tomadas pelos americanos. Se fosse sintetizar o que eu penso, nós vamos ter mais vantagens do que desvantagens nessa briga dos americanos com os chineses”
Oportunidades para o Brasil
Nesse momento em que uma nova acomodação do comércio global se desenha, o Brasil pode ser beneficiados. “O Brasil pode ocupar um espaço em mercados que são tradicionalmente abastecidos por produção americana. Falo mais intensamente no caso do Canadá e do México, onde 80% do comércio desses países é com os Estados Unidos.”
Mas Furlan também destaca que outros mercados, como Oriente Médio e Ásia, principalmente para produtos do agronegócio. Segundo o ex-ministro, em reunião com grupo de empresários japoneses, o Wise Group, os executivos de empresas como Toyota levantaram interesse no etanol brasileiro, pois montadoras estão interessadas em explorar a tecnologia para seus automóveis. A Toyota, por exemplo, tem fábrica nos EUA, e ano passado anunciou investimentos de R$ 11 bilhões no Brasil até 2030, incluindo uma fábrica de 160 mil metros quadrados em Sorocaba (SP), que começa a operar em 2026.
“É um investimento grande. Então, eles estão olhando também como minimizar o impacto e como tirar vantagem [em relação às tarifas americanas]. E uma das coisas que foi falado é a questão do etanol. Porque a indústria automotiva japonesa está apostando muito nos carros híbridos. Isso, para mim, cria uma oportunidade grande”.
‘Periféricos, mas não tão periféricos’
Luiz Fernando Furlan avalia que o mundo está “vivendo uma era que vai ficar para a história”, em termos geopolíticos. Isso porque, segundo ele, além do novo momento no comércio global com tarifas, Furlan vê uma grande mudança com acordos ocorrendo entre os países chamados “periféricos, mas não tão periféricos”, como a criação, pela China, do sistema de compensação de exportações em yuan. “Deixando de lado a bengala do dólar que foi criada antes até de na Segunda Guerra Mundial”, diz.
O movimento, diz, levanta de novo uma ameaça aos americanos.
“Hoje as reservas internacionais dos países são majoritariamente em títulos do Tesouro americano. E os maiores detentores de títulos do Tesouro americano são o Japão e a China. No momento que tiver uma alternativa de você ter as reservas e outras moedas que sejam sólidas, o que vai acontecer com o mercado internacional é uma mudança que veio para ficar. E isso pode mudar muito a capacidade dos americanos de ter uma dívida internacional de baixíssimo risco”.
O post ‘Alckmin está certo, melhor coisa para o Brasil é ficar quieto’, diz Furlan sobre tarifaço apareceu primeiro em ISTOÉ DINHEIRO.