Crítica | Loucos por cinema! – Arnaud Desplechin mistura ensaio, documentário e autoficção para transmite seu entusiasmo aos cinéfilos

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Como expressar a verdadeira paixão pelo cinema sem perder a conexão com o espectador? Loucos por Cinema! (Spectateurs !) do diretor francês Arnaud Desplechin é uma experiência cinematográfica ambiciosa, porém exaustiva.

A proposta de explorar o amor pelo cinema e sua importância na vida do cineasta se traduz em uma colagem de estilos e abordagens que, em vez de enriquecer a narrativa, acabam fragmentando a experiência do espectador. Essa mistura de tentativas diferentes distancia o público da investigação proposta, tornando a jornada menos envolvente do que poderia ser.

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O longa apresenta momentos brilhantes, como as reflexões sobre a origem do cinema e sua relação com outras artes, além das homenagens a cineastas e obras fundamentais na formação do diretor, como os irmãos Auguste e Louis Lumière, Eadweard Muybridge e ainda Thomas Edison.

O segmento em que Desplechin discute o impacto do documentário Shoah (1985), de Claude Lanzmann, é particularmente comovente, revelando como o cinema pode testemunhar horrores sem recorrer a imagens explícitas. Também são interessantes os trechos autobiográficos, onde o alter ego Paul Dedalus (Louis Birman/ Milo Machado-Graner/ Sam Chemoul) ressurge para ilustrar passagens marcantes da vida do cineasta.

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Porém, a falta de coesão entre esses momentos faz com que a obra se arraste, mesmo com seus 88 minutos de duração. Loucos por Cinema! flerta com a reportagem, o ensaio, o documentário e a ficção autobiográfica, mas nunca se estabelece plenamente em nenhum desses gêneros, deixando o espectador perdido em meio a uma sucessão de estilos e propostas.

Somente na parte final, quando surge a ideia de que o espectador deseja se inserir na tela e fazer parte do filme, é que finalmente sentimos uma conexão mais forte com o percurso de Desplechin. O encontro do cinéfilo com o ator fetiche do diretor, Mathieu Amalric (O Escafandro e a Borboleta), cuja voz narra todo a trajetória, celebra essa interseção apaixonada entre voyeur e transmissor de mensagens em feixes de luz.

Mathieu Amalric em Loucos Por Filmes!
Mathieu Amalric em Loucos Por Filmes!

Se o objetivo é sentir a verdadeira magia do cinema, há opções mais envolventes e eficazes, como Cinema Paradiso (1988), de Giuseppe Tornatore, e Os Fabelmans (2022), de Steven Spielberg, cujos enredos oferecem uma abordagem mais tocante sobre o amor pela sétima arte. Filmes independentes como I Like Movies (2022), de Chandler Levack, e Os Sonhadores (2003), de Bernardo Bertolucci, também capturam a paixão cinéfila com mais naturalidade e entusiasmo.

Para além da ficção, os documentários de Agnès Varda e Eduardo Coutinho oferecem uma visão muito mais fascinante sobre o amor pelo cinema e a construção de emoções através das imagens. Além disso, as coletâneas de depoimentos de cineastas, como Quarto 666 (1982), de Wim Wenders, e Quarto 999 (2023), de Lubna Playoust, são alternativas mais ricas para quem deseja refletir sobre o impacto do cinema na vida de seus espectadores e realizadores.

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Com seu tom subjetivo, Arnaud Desplechin faz de Loucos por Cinema! um tributo pessoal e intenso ao cinema, mas sua execução dispersa compromete seu impacto. É uma obra que demanda paciência e afinidade com o estilo do diretor, mas que, para muitos, pode se tornar um exercício fatigante em vez de uma celebração inspiradora da sétima arte.

 

Lançado no Festival de Cannes 2024, Loucos por Cinema! chega aos cinemas brasileiros no dia 13 de março de 2025, com distribuição de Filmes do Estação.

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