Apple ganha tempo para se defender de acusação da Meta no Cade; empresas criticam App Store em audiência

Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade)

Esta semana tem sido bastante movimentada para a Apple — não só por conta do lançamento de um novo dispositivo, mas também por imbróglios regulatórios no Brasil.

Digo isso pois tivemos ontem mais um desenrolar da representação feita pela Meta (empresa dona do Facebook, do Instagram e do WhatsApp) contra a Maçã em janeiro, a qual diz respeito ao recurso Transparência de Rastreamento de Apps (App Tracking Transparency, ou ATT), do iOS.

Segundo informações do O Globo, a Maçã ganhou mais alguns dias para se defender da acusação de privacy washing feita pela companhia de Mark Zuckerberg ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

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Agora, ela tem até o dia 28 de fevereiro (uma sexta-feira) para formular uma resposta, e não mais apenas até o dia 24/2. Essa prorrogação vem logo após a Apple solicitar um prazo de 30 dias para apresentar a sua defesa — algo que, para ela, seria necessário pois a versão pública do processo (de 86 páginas) é “notavelmente extensa”. A empresa também argumentou que não teve acesso à versão restrita do processo, o que teria dificultado ainda mais o trabalho dos seus advogados.

O Cade, em contrapartida, disse que isso não seria possível por conta da “necessidade de análise célere do processo em questão”, tendo esticado o prazo apenas até a data supracitada. Caso a Maçã falhe em apresentar uma defesa, terá que pagar multa diária de R$5.000 — o valor poderá aumentar em até 20x “se necessário para garantir sua eficácia”, ainda segundo o órgão regulador.

De acordo com a Meta, além de incentivar os seus usuários a ativar a ATT ao baixar novos aplicativos, criando uma espécie de “aceite automático”, a Apple não trata seus próprios serviços da mesma forma. Esse comportamento, ainda de acordo com a gigante das redes sociais, prejudica a concorrência no mercado de publicidade digital e favorece a Apple de maneira desleal.

Audiência sobre a App Store

Na última segunda-feira (17/2), comentamos aqui que o Cade havia marcado para ontem uma audiência com o objetivo de discutir aspectos relacionados à concorrência no iOS e no Android (do Google), bem como que ela contaria com a presença de outras empresas e organizações da sociedade civil que poderiam apresentar testemunhos.

Pois bem, a audiência aconteceu e, também de acordo com informações do O Globo, nomes como Match Group (a empresa dona do Tinder) e a Epic Games se fizeram presentes, bem como pesquisadores, representantes de fintechs e outras organizações.

A primeira parte a se pronunciar na audiência foi justamente a Apple, por meio do seu diretor jurídico para América Latina e Canadá, Pedro Pace. De acordo com ele, a Apple não possui um monopólio no mercado de smartphones, uma vez que tem apenas 10% de market share. O mesmo se estenderia para a App Store, levando em consideração que 99% dos aplicativos distribuídos por lá são desenvolvidos por terceiros.

A Apple enfrenta a concorrência direta e efetiva em todos os mercados nos quais atua […] Nosso modelo integrado e as proteções de privacidade e segurança fornecem aos brasileiros uma opção diferenciada e um mercado muito competitivo.

Em uma possível referência ao plano do Ministério da Fazenda de transformar o Cade em uma espécie de “regulador de Big Techs“, Pace concluiu sua fala argumentando que decisões regulatórias podem “prejudicar os consumidores e a concorrência” e pediu ao Brasil que tenha cuidado ao analisar o exemplo da União Europeia, que recentemente promoveu uma série de mudanças nessa seara com a Lei dos Mercados Digitais (Digital Markets Act, ou DMA).

Representada por Mauricio Longoni, diretor sênior de desenvolvimento de jogos da empresa, a Epic Games argumentou que o controle exercido pela Apple e pelo Google no mercado de apps obriga “os desenvolvedores a se submeterem a termos e taxas abusivos”.

Priscila Brolio, advogada do Match Group, por sua vez, elogiou a medida preventiva movida pelo Cade em novembro passado a qual obrigava a Apple a relaxar várias das restrições impostas pelas diretrizes da App Store a desenvolvedores, sob pena de multa diária de R$250.000. Como bem sabemos, a Apple não só recorreu à decisão como conseguiu derrubar a medida.

A advogada argumentou que as diretrizes da App Store prejudicam a inovação e afetam o diretamente o crescimento do Tinder, destacando ainda que “nada justifica que se cobre um valor abusivo de 30% da receita dos desenvolvedores de conteúdo digital”. Eduardo Lopes, presidente da Zetta (associação que representa fintechs como Nubank e PicPay), apresentou argumentos parecidos e aproveitou para criticar principalmente o controle que a Apple tem sobre o NFC 1 dos seus dispositivos — tecnologia que permite pagamentos por aproximação.

Após analisar o caso da Apple e o do Google, o diretor de relações institucionais da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (PROTESTE), Henrique Lian, defendeu que o Cade tome ações que visem apenas a gigante de Cupertino, devido ao seu modelo mais fechado do que o encontrado em dispositivos Android:

A Apple opera de forma totalmente verticalizara, exercendo forte controle sobre consumidores e desenvolvedores, além de cobra taxa exorbitante.


A audiência completa, que teve pouco menos de quatro horas de duração, pode ser conferida nesse vídeo.

Notas de rodapé

1    Near field communication, ou comunicação por campo de proximidade.
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