Os penduricalhos do Judiciário & Cia.

Marcos Cardoso*

O supremo ministro Flávio Dino também vai questionar as imorais aposentadorias de juízes que cometeram crimes? Recentemente, ele condenou salários abusivos de juízes e suspendeu retroativos de alimentação, considerando um “inaceitável vale-tudo”. A Justiça Federal de Minas Gerais havia liberado o pagamento retroativo a juiz relativo à verba indenizatória por auxílio-alimentação de 2007 a 2011. Uma indecência.

O ministro Cristiano Zanin pediu explicações ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso e o Conselho Nacional de Justiça mandou suspender o auxílio-alimentação de R$ 10 mil pagos aos magistrados do Estado em dezembro. O tribunal defendeu a legalidade do que ficou conhecido como o vale-peru, por “assegurar a cobertura das necessidades nutricionais diárias” de servidores e magistrados. Um deboche.

A Folha de São Paulo apurou que os funcionários do Judiciário federal e dos estados lideram os ganhos salariais entre todas as carreiras do funcionalismo. Os servidores da Justiça Federal conseguiram ganhos de 130,1% acima da inflação desde 1985 e, nos judiciários estaduais, a alta foi ainda maior: 213,6%. Sem contar que o bolo que a elite do funcionalismo leva para casa cresce mais com um fermento chamado penduricalho.

Graças a esses benefícios criados nos gabinetes das próprias cortes, milhares de juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores burlam o teto constitucional, que é de R$ 46.366,19 desde 1º de fevereiro e corresponde aos salários de ministros do STF, do presidente da República, deputados federais e senadores.

Em Sergipe, todos os 81 magistrados do TJSE receberam em dezembro passado supersalários superiores a R$ 100 mil, quando os contracheques nos estados eram então constitucionalmente limitados a R$ 39,7 mil, cerca de 90% do subsídio mensal de um ministro do STF. A denúncia do Sindijus (Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado de Sergipe) repercutiu nacionalmente no jornal O Globo e não se conhece uma explicação do Tribunal de Justiça para tal prêmio natalino.

“Além das verbas salariais previstas na Constituição, como subsídio e 13º salário, constam nas remunerações dos magistrados gordas indenizações (auxílio-saúde de R$ 6 mil, auxílio-alimentação e auxílio-folga de até R$ 13 mil – benefício pago aos juízes sergipanos por folgas adquiridas a cada três dias trabalhados), vantagens pessoais (adicional por tempo de serviço) e eventuais (adicional de férias e indenização de licença-prêmio)”, denuncia o texto assinado por Rodrigo Castro na coluna de Lauro Jardim.

Simetria constitucional

A coisa só piora quando o Ministério Público e até os Tribunais de Contas se utilizam de um mecanismo legal chamado simetria constitucional para também inflarem vencimentos dos procuradores da República ou dos estados, promotores, ministros do TCU, conselheiros e membros dos Ministérios Públicos de Contas.

O princípio da simetria está assegurado na Constituição. O artigo 129, § 4º, determina que o MP deve ter aplicados, no que couber, os mesmos direitos e deveres da magistratura. Os Conselhos Nacionais do Judiciário e do MP entendem que os benefícios concedidos a juízes também devem ser aplicados a promotores e vice-versa.

Já os ministros do Tribunal de Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos, vencimentos e vantagens dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (Emenda Constitucional nº 20, de 1998). E os conselheiros de Tribunais de Contas são equiparados aos magistrados (art. 73, § 3º, da CF/88, sendo-lhes aplicada, por analogia, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional).

Um estudo do DadosJusBr, projeto da Transparência Brasil, de 2023, revelou como o abuso do princípio constitucional da simetria entre as carreiras do Judiciário e do Ministério Público originou a criação de uma licença compensatória. A benesse é fruto de uma série de distorções da gratificação por exercício cumulativo. Recebem valor extra correspondente a 1/3 do salário magistrados e promotores que atuam em mais de um juízo ou são responsáveis por muitos processos.

Parece que o STF despertou para o descalabro que é o abuso da legislação gerando esse inaceitável vale-tudo definido por Flávio Dino. Será necessário fazer uma revisão da Constituição para dar um freio a essa farra? O Congresso estaria disposto a mexer com a casta dos juízes? A ver.

Aposentadoria compulsória

Não nos descuidemos que outro benefício muito exclusivo praticamente absolve os senhores magistrados que por ventura tenham cometido algum crime. É a aposentadoria compulsória de juízes, considerada uma pena disciplinar que pode ser aplicada pelo tribunal onde o magistrado atua ou pelo Conselho Nacional de Justiça.

Acredite que a aposentadoria compulsória é considerada a mais grave das cinco penas disciplinares que podem ser aplicadas a juízes vitalícios e pode ser aplicada até quando o magistrado cometer crime comum ou de responsabilidade.

Recentemente, houve um caso no Tribunal de Justiça de Sergipe (já houve outros no passado), quando o desembargador Luiz Antônio Mendonça foi afastado após uma demorada decisão do CNJ. O desembargador foi aposentado compulsoriamente no dia 17 de setembro de 2024, quando faltavam apenas três meses para completar 75 anos, idade limite para permanecer no cargo.

O magistrado que é aposentado compulsoriamente continua a receber proventos ajustados ao tempo de serviço. E não importa que ele seja peça central de investigação da Polícia Federal que apurou a venda de sentenças judiciais a integrantes de uma organização criminosa com atuação em cidades sergipanas.

*É jornalista. [email protected]

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