Excesso de cabos e fios é problema que se arrasta há anos em Juiz de Fora

Excesso de cabos e fios

A fiação aérea em Juiz de Fora continua sendo alvo de transtornos e preocupação por parte da população e do Poder público. Quem circula pela cidade, especialmente pela Região Central, se depara facilmente com postes abarrotados de fios de telefonia, cabeamento de internet e de energia elétrica. Além da poluição visual, a desordem na fiação representa riscos à segurança e compromete a infraestrutura urbana. A Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) e a Cemig informaram que têm intensificado a fiscalização, mas os desafios para ordenar a fiação ainda não foram superados.

A situação e o imbróglio envolvendo a fiscalização e reparos da fiação emaranhada e irregular se arrasta há anos. Matéria publicada pela Tribuna em outubro de 2023 mostrou o aumento da fiação desordenada em postes. A reportagem percorreu diferentes ruas da cidade e comparou a quantidade de fios presentes em postes naquele ano com registros feitos, também pelo jornal, em 2015.

Agora, em Tribuna voltou às ruas, aos mesmo locais, para registrar a situação atual. As imagens dos fotojornalistas Leonardo Costa e Felipe Couri novamente evidenciam a multiplicação do emaranhado de fios nos locais nos últimos dois anos. Além da poluição visual, a instalação desordenada representa riscos em dias de chuvas intensas, aumentando as chances de rompimentos, curtos-circuitos e acidentes elétricos.

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Esquina da Rua Santo Antônio com a Rua Espírito Santo em 2015/2025
(Foto: Leonardo Costa)

Mais de 700 pedidos de regularização foram emitidos em 2024, diz PJF

Segundo a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), a Secretaria de Desenvolvimento Urbano com Participação Popular é a pasta responsável por fiscalizar os postes da cidade. Em caso de irregularidades, a concessionária responsável pelo posteamento, neste caso a Cemig, é notificada para adequar a fiação. O prazo usual para consertos é de 30 dias, mas em situações urgentes ou que apresentem algum risco, o prazo pode cair para cinco dias.

Segundo a PJF, a verificação aérea é parte da rotina dos fiscais de posturas – agentes que fiscalizam e orientam o cumprimento de normas e regulamentações municipais – e, ao encontrarem alguma irregularidade, imediatamente dão início aos trâmites legais para a regularização. Até dezembro de 2023, foram emitidos 623 documentos fiscais para regularização. Em 2024, esse número subiu para 719, com multas já julgadas procedentes, além de um grande volume de autos de infração que estão sob análise, o que pode resultar em mais de R$ 15 milhões em penalidades, entre multas e sanções administrativas.

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Fiação irregular entre as ruas Batista de Oliveira e Santa Rita, no Centro de Juiz de Fora (Foto: Leonardo Costa)

Cemig afirma que recolheu 15 toneladas de fiação irregular

A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) é a concessionária responsável pelos mais de 50 mil postes de Juiz de Fora e, por consequência, por autorizar o uso dos equipamentos públicos por empresas de telecomunicações, mediante análise documental, contrato e aprovação de projetos técnicos. 

Atualmente, segundo a companhia, 41 empresas têm contratos regulares com a Cemig em Juiz de Fora. Esse número é quase sete vezes maior do que o apresentado em uma audiência pública realizada na Câmara Municipal em fevereiro de 2024. Na ocasião, representantes da Cemig afirmaram que apenas seis empresas que ocupavam os postes da companhia estavam regularizadas, embora pelo menos 60 utilizassem o posteamento de forma clandestina. 

A responsabilidade pela fixação e preservação dos cabos, fios e cordoalhas de acordo com as normas técnicas é das próprias prestadoras de serviços de telecomunicações, assim como a operação, manutenção e correção de eventuais irregularidades, incluindo os custos. Segundo a companhia, em caso de descumprimento das cláusulas estipuladas em contrato, a Cemig aplica sanções às empresas que podem variar desde notificações, multas ou até mesmo a retirada dos cabos. 

Com o intuito de identificar e autuar empresas que usam a infraestrutura da Cemig de forma irregular, desde 2023, a empresa informou que realiza um censo em sua área de concessão, inspecionando mais de 2,5 milhões de postes. Desde o início do censo em 2023, até o final de 2024, mais de 70 mil notificações para empresas de telecomunicações que atuam na área de concessão da Cemig foram emitidas. Além disso, em 2024, a companhia recolheu cerca de 15 toneladas de cabos e equipamentos irregulares.

Lei 14.350/2022 

A lei 14.350 de 2022, criada pelo vereador Maurício Delgado (Rede), tem como principal objetivo disciplinar a instalação, manutenção e remoção de fiações aéreas em postes no município de Juiz de Fora. A norma busca garantir a segurança da população, a organização urbana e a preservação do meio ambiente. 

A lei prevê, também, a aplicação de multas às empresas que descumprirem as normas. O valor das multas varia conforme a gravidade da infração e pode ser aplicado de forma cumulativa em casos de reincidência.

Em conversa com a reportagem da Tribuna, o vereador Maurício Delgado, proponente da lei, contou que a ideia  surgiu da insatisfação com a poluição visual e os riscos à segurança causados pela fiação desordenada. Desde a sanção da norma, multas já foram aplicadas, mas Delgado reconhece que não há mudanças visíveis a olho nu na cidade.

O parlamentar afirma que espera que os recursos arrecadados com as multas sejam reinvestidos. “A gente sabe que a PJF não tem material humano para se fazer (a fiscalização). Que ela possa, então, reverter essas multas em equipamento, em recurso humano para estar fazendo cada vez mais a fiscalização. Aí sim a gente tem uma melhoria. Essa é a minha expectativa, é para isso que a lei foi colocada em apreciação, votada, aprovada e sancionada.”

Na avaliação do parlamentar, um dos principais empecilhos que a norma enfrenta para ser de fato cumprida é o custo que ela impõe às empresas. “Lógico que tem resistência. A partir do momento que você tem uma lei que passa a te criar um trabalho e gerar um custo, você tem resistência.”

Situação foi judicializada

Outro desafio na aplicação da lei é a necessidade de diálogo entre a Prefeitura e a Cemig para garantir a efetividade das ações de fiscalização e regularização. Criada em conjunto com o Executivo, a lei depende da atuação dos órgãos municipais, juntamente com a companhia estadual responsável pelos postes da cidade.

No entanto, o caso chegou a ser judicializado, como noticiado pela Tribuna em setembro de 2024. Na ocasião, a Justiça, por meio de processo movido pela PJF, obrigou a Cemig a retirar os fios rompidos e adequar a fiação da região central às normas técnicas específicas dentro de 15 dias, sob possibilidade de multa diária de R$ 10 mil. 

Sobre o caso, a PJF afirmou, em nota, que “em razão da condenação, a Cemig encontra-se, neste momento, com dívida ativa junto ao Município em função das multas não pagas.”

A Cemig, por sua vez, informou que realizou reuniões com as empresas de telecomunicações de Juiz de Fora para apresentar o plano para atender às adequações requeridas no processo, bem como em todo município. “Vale destacar que, mesmo a regularização dos cabeamentos de telecomunicações não sendo responsabilidade da Cemig, a companhia procedeu com intervenções em campo a fim de sanar situações emergenciais”, citou em nota.

No texto, a companhia embasou seu posicionamento na Resolução Normativa Aneel 1.044/2022, e informou que, de acordo com resoluções federais vigentes, a responsabilidade pela correção e regularização das redes de telecomunicações é da cessionária de telecomunicações proprietária do ativo conforme. “Desta forma, a Cemig informa que procedeu com todas as medidas necessárias e possíveis para o cumprimento da decisão.”

Fiação subterrânea é alternativa utópica

A arquiteta e urbanista Miriam Dias, projetista da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) há quase 30 anos, analisa que a fiação desordenada compromete a qualidade do envio dos sinais elétricos e podem se tornar um risco à segurança da população.

“Muitos estão expostos aos desgastes naturais por falta de manutenção adequada e acúmulo até mesmo de fios não energizados que não foram devidamente descartados. Podem também se tornar um risco à segurança por estarem expostos às intempéries, situações que fazem árvores caírem e romperem os fios energizados, ou mesmo acidentes automobilísticos que derrubam postes e geram instabilidade ou interrupção do envio de energia, podendo ocasionar na queima de importantes equipamentos e aparelhos eletrodomésticos.”

Para ela, a qualidade de vida da população também entra em cheque quando o assunto é a fiação desordenada. “A situação contribui para a poluição visual, que contribui para despertar um sentimento de desordem, de desqualificação da paisagem urbana e repulsa pelos espaços de ocupação pública”, analisa.

No entanto, a especialista acredita que o problema é complexo e envolve múltiplos atores para que seja de fato solucionado – cenário que parece distante em Juiz de Fora. “Há muitos atores envolvidos nas consequências da condição atual da fiação urbana. Um bom planejamento urbano pode mitigar o problema da fiação desordenada nos espaços públicos por meio de diversas estratégias integradas, envolvendo regulação, infraestrutura, tecnologia e gestão eficiente.”

Ela explica que a transferência da fiação para o subsolo seria a melhor opção para uma cidade mais segura e com maior qualidade de vida. “Esta seria uma das principais soluções para o crescimento desordenado da fiação” explica. Porém o custo das obras ainda é alto. “Jamais será possível de se executar sem que aja uma séria parceria entre o poder público e a iniciativa privada, com a contribuição da população, para que as soluções sejam implantadas de forma progressiva, atacando primeiramente os pontos críticos.”

Apesar dos desafios, a pesquisadora cita outras cidades já adotaram leis e planos de planejamento urbano a fim de diminuir os riscos e a poluição visual causada pela colocação desordenada de fios. Segundo ela, em São José dos Campos, São Paulo, uma legislação municipal foi criada para ordenamento da fiação e remoção dos cabos inutilizados, estabeleceu prazos para as concessionárias adequarem seus postes e priorizou áreas centrais e vias comerciais nos projetos de enterramento gradual da fiação, sendo um dos projetos mais avançados de modernização da infraestrutura urbana do Brasil, com foco em organização e tecnologia.

Além da cidade paulista, Curitiba, no Paraná, as áreas históricas e turísticas se tornaram prioridade, aliando planejamento urbano e políticas públicas inovadoras, sendo referência em infraestrutura organizada. Miriam também cita Medelín, na Colômbia. O local passou por uma grande transformação urbana, que incluiu um plano agressivo de modernização da infraestrutura elétrica, substituindo postes sobrecarregados e criando um projeto de cidades inteligentes, incorporando postes multifuncionais com iluminação pública e tecnologia 5G.

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