Dicas para aprender a degustar vinhos

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Por Thamirys Schneider, sommelière da Wine, o maior clube de assinatura de vinhos do mundo

Ao contrário do que muitos imaginam, não é preciso ser um expert para degustar vinhos e fazer boas escolhas. Com um pouco de conhecimento, é possível tirar o máximo proveito desse exercício tão prazeroso, que possibilita entender ainda mais sobre a tipicidade e a proposta de cada rótulo. 

Confira a seguir algumas dicas para desenvolver os sentidos e aproveitar ainda mais sua experiência com vinhos.

Quais são as etapas da degustação? 

Basicamente, são três: análise visual, olfativa e gustativa. Mesmo havendo degustações temáticas, com focos diferentes, como vertical e horizontal, essas três etapas permanecem as mesmas. 

O que são degustação vertical e horizontal? 

A degustação vertical analisa o mesmo rótulo de um produtor em diferentes safras, para identificar a evolução deste vinho com o passar dos anos. Já a horizontal analisa o mesmo tipo de vinho e safra, porém, de diferentes produtores. Em cada modalidade de degustação, há uma grande possibilidade de comparações.

Como analisar o aspecto visual de um vinho? 

O primeiro passo é utilizar uma taça transparente – as coloridas impedem a análise visual. Outro ponto importante é servir a dose de degustação, pois se a taça estiver muito cheia, pode limitar o movimento de inclinação (para visualizar a tonalidade), o giratório (para analisar os aromas) e também prolongar a duração da degustação, elevando a temperatura da bebida para além do ideal. 

Qual a quantidade ideal de vinho a ser servido nesse caso? 

O volume ideal de bebida para uma degustação depende da taça escolhida. Se, por exemplo, a taça for a ISO (com capacidade aproximada de 220 ml), a recomendação é servir cerca de 50 ml de vinho. Para outros modelos, convém servir no máximo  1⁄3 de vinho, o que equivale a 150ml. Porém, numa prova de degustação, o ideal é colocar em torno de 100 ml, o que permite manter a temperatura, girar o vinho na taça, liberar melhor os aromas e poder avaliar melhor o aspecto visual.

Qual o primeiro passo da degustação? 

A primeira etapa da degustação é visual, portanto, escolha um ambiente onde a luz branca seja branca. Comece posicionando a taça sobre um fundo branco (toalha, guardanapo, folha de papel). Segure-a pela haste e incline-a para frente. Observe a tonalidade do vinho, da borda do líquido até o centro. Perceba o brilho do líquido e a presença ou não de sedimentos. 

Como a evolução da cor dá indícios sobre a idade do vinho? 

Os brancos mais jovens geralmente apresentam tons de amarelo-claro ou esverdeados, enquanto os mais envelhecidos com o tempo tendem a escurecer para dourado e âmbar. Já os tintos, em sua maioria, quando mais jovens, apresentam tons mais escuros como púrpura, rubi mais escuro e profundo, e com o tempo, à medida que envelhecem, tendem a clarear, progredindo para tons mais atijolados, vermelho granada e alaranjados. Mas há casos em que podemos nos enganar ao analisar apenas o aspecto visual, pois a coloração também é resultado do armazenamento da garrafa, da cor do vidro, pH do vinho, entre outros fatores. 

A taça deve ser girada antes ou depois da análise olfativa? 

Não existe uma regra rigorosa, mas é bacana analisar notas aromáticas antes e depois de girar a taça, para verificar se elas mudam (ou surgem) após a oxigenação, sendo que alguns vinhos expressam os aromas aos poucos, de acordo com o tempo e o contato com o oxigênio. O movimento giratório tende a facilitar a concentração dos aromas na parte superior da taça, o que favorece a percepção.

O que considerar durante a análise olfativa? 

Além dos aromas do vinho em si, uma reflexão interessante é sobre a relação do caráter do aroma frutado com o clima da região onde o rótulo foi produzido. O nível de maturação das uvas que o compõem também permite saber se a bebida passou ou não por algum tipo de amadurecimento e se tem notas provenientes do envelhecimento em garrafa.

E como perceber essa relação? 

Em regiões de clima frio, por exemplo, onde muitas vezes a uva pode não amadurecer completamente, os aromas frutados tendem a remeter a frutas mais frescas. Já em áreas mais quentes, onde a uva pode até mesmo passar do ponto de amadurecimento, os aromas tendem a ser de frutas maduras, lembrando as mais doces, ou até mesmo geleia ou compota. É possível haver indícios também sobre o contato (ou não) do vinho com madeira, que pode ter ocorrido durante a fermentação ou o amadurecimento. 

Alguns aromas podem indicar possíveis defeitos no vinho? 

Sim, desde o cultivo da uva ao armazenamento do vinho engarrafado. Um exemplo de defeito é o chamado bouchonné, com aromas semelhantes ao do mofo e do papelão molhado, ocasionado pelo contato com TCA, um composto químico que pode ser encontrado na rolha de cortiça ou nas instalações e equipamentos de uma vinícola. A oxidação não desejada também é um defeito que proporciona aromas desagradáveis ao vinho, como o de vinagre (ácido acético), desenvolvido devido ao contato excessivo do líquido com o oxigênio, que pode ocorrer na vinificação ou após o engarrafamento. 

Qual a dica para detectar o maior número de aromas e sabores? 

A percepção e identificação dos aromas e sabores de um vinho estão ligadas à memória olfativa de cada um de nós, ou seja, cheiros e gostos que temos em mente desde a infância. Logo, se não temos a referência de certo aroma ou sabor, não conseguimos identificá-lo no vinho. Por isso, a dica é cheirar e provar elementos que podem ser encontrados nos vinhos como frutas, flores, ervas, vegetais, especiarias, condimentos, entre outros. 

É possível fazer esse treino no dia a dia? 

Certamente! De eventos ao ar livre até o momento quando cozinhamos são oportunos para aumentar o repertório pessoal de aromas e sabores. É importante salientar que essa relação das notas aromáticas dos vinhos com nossa memória olfativa ocorre porque o composto químico presente, por exemplo, nas frutas, ervas e especiarias (que produz o respectivo aroma no vinho), também está nas uvas, ou pode ser desenvolvido durante a fermentação ou o envelhecimento do vinho. 

O que sobressai na degustação de brancos? 

Na análise gustativa de exemplares brancos é avaliada o corpo, o dulçor, a acidez, o amargor e o álcool. A acidez é um ponto importante para qualquer tipo de vinho, para que a bebida seja agradável ao paladar, porém, é um dos destaques dos brancos. A origem dessa característica está principalmente na uva e na produção (fermentação). Ao entrar em contato com a mucosa da boca, os ácidos do vinho desequilibram o pH local e, para equilibrá-lo, a cavidade bucal é inundada com saliva. Assim, quanto maior a acidez do vinho, maior será a salivação. 

E quanto aos tintos, o que observar? 

Levam-se em conta também todos os fatores observados na degustação dos brancos. Porém, nos tintos também avaliamos os taninos, substâncias naturalmente produzidas pela videira, que dão a sensação de ressecamento da boca, a chamada adstringência. Eles estão presentes na casca das uvas, nas sementes e nos engaços. Outra fonte de taninos é o carvalho, que pode transferi-los para os vinhos durante o amadurecimento em barricas. 

Qual o destaque gustativo dos espumantes? 

Além dos pontos como corpo, dulçor, acidez, amargor e álcool, a cremosidade é um dos destaques do espumante. É desenvolvida durante a formação das borbulhas (perlage), e quanto mais tempo o vinho permanece em contato com suas borras, maior será o nível de cremosidade.

Por que é comum o ato de cuspir o vinho após degustá-lo? 

O ato de cuspir geralmente é praticado quando há um grande volume de rótulos a degustar em um único momento. Para evitar alterações nas análises, o mais indicado é cuspir o vinho, pois ao ingerir pequenos goles ao longo da degustação, em determinado momento os sentidos podem perder a sensibilidade, interferindo de forma negativa nas impressões de um exemplar. Além disso, ao não tomar vinho, não há ingestão de álcool, o que evita o comprometimento da sensibilidade dos sentidos. 

Algum atributo principal pode ser avaliado somente após a ingestão do vinho? 

Não. Quando passamos o vinho pela boca, conseguimos avaliar os principais pontos citados anteriormente. Logo percebemos que não há necessidade de engolir o vinho para realizar a análise gustativa. No livro O Gosto do Vinho (WMF Martins Fontes, 258 págs.), de Émile Peynaud e Jacques Blou- in, cita-se que tanto após beber ou cuspir o vinho, é possível perceber persistência e equilíbrio geral entre todos os sabores e aromas. 

Como concluir se um vinho é leve ou encorpado? 

A leveza é um indicativo do corpo do vinho e, por si só, não é relevante para a conclusão de uma degustação. No paladar, o corpo do vinho provoca a sensação de peso, de maior ou menor densidade que o líquido revela na boca. Comparado a um vinho leve, um exemplar encorpado passa a sensação de ser muito mais pesado e denso na boca.

Para elucidar melhor a situação, vale um exemplo: imagine um suco de morango e uma vitamina de morango batida com leite. Por mais seja a mesma fruta, a vitamina tem mais densidade no paladar, e o suco é mais leve e delicado. Não é sobre o que é melhor ou pior, mas sim sobre propostas e estilos e um não anula a qualidade do outro.

Como saber se o vinho é equilibrado e harmônico? 

Podemos concluir que um vinho é equilibrado e harmônico quando nenhum de seus componentes gustativos (corpo, acidez, taninos, álcool, doçura) sobressai ou falta. Todos estão presentes de forma bem integrada. 

Quando se diz que um vinho é complexo, o que significa? 

Trata-se de um vinho com muitos aromas e sabores, um exemplar que surpreende a cada taça, com novas percepções. 

A temperatura do vinho pode comprometer as impressões da degustação? 

Com certeza e de várias formas. Ao degustar um vinho muito gelado, perdemos a percepção de aromas, assim como as papilas ficam mais anestesiadas, o que dificulta perceber o vinho na boca.

A temperatura muito acima do ideal também pode fazer o vinho parecer muito mais alcoólico do que realmente é. Outro exemplo: quando um tinto é degustado com a temperatura muito abaixo da indicada, a sensação de adstringência dos taninos aumenta, eles ficam mais duros. 

A forma de segurar a taça também influencia a degustação? 

Sem dúvida! Segurar a taça pela haste ou pela base ajuda a manter a temperatura por mais tempo. É bom evitar segurar a taça pelo bojo, gesto que ajuda a elevar a temperatura dos vinhos mais rapidamente. 

A ordem equivocada de serviço dos vinhos prejudica a experiência? 

Este é um ponto muito importante. Degustar um vinho encorpado, com muitos taninos, antes de um vinho leve, pode atrapalhar a percepção das características do segundo exemplar. A sugestão é ordenar os vinhos de acordo com o peso, o tipo e o nível de dulçor.

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