Com inflação desancorada, taxas do Tesouro IPCA+ beiram os 7%. É hora de investir?

Há não muito tempo, uma remuneração de IPCA+7% para um título do Tesouro Direto parecia fora de cogitação. Nos últimos dias deste mês de outubro, esse é o patamar de remuneração bem próximo do ofertado pelo Tesouro Nacional em títulos pós-fixados.

+IPCA-15 acima do esperado reforça tese de juros em alta

Tesouro IPCA+2029, com vencimento em maio de 2029, é negociado atualmente uma remuneração de IPCA + 6,81%. O título mais longo do Tesouro Direto atrelado ao IPCA – com vencimento em 2055 –  oferece uma remuneração de IPCA + 6,6%.

O aumento de atratividade desses títulos de renda fixa ocorre me meio a uma desancoragem das expectativas de inflação, com um mercado esperando que o IPCA ultrapasse o teto da meta firmada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) neste ano de 2024, de 4,5%.

Nesse sentido, o ceticismo com o ambiente fiscal segue em voga, com diversas entidades e agentes de mercado tendo perspectivas negativas sobre a possibilidade de o governo cumprir as metas do arcabouço fiscal e realizar um ajuste nas contas públicas.

“No mercado doméstico, o tema principal ainda é o fiscal. Não vimos ainda nenhum compromisso concreto do governo de um controle de gastos, mais do lado receita do que do lado de despesas e isso sustenta a percepção de risco elevada aqui no Brasil. Nas últimas semanas vemos esse risco subindo, elevando perspectivas de juros do mercado local, com juro nominal na casa dos 13%, com títulos que inclusive passaram dessa faixa”, comenta Camilla Dolle Head de Research de Renda Fixa.

Os economistas da casa possuem expectativas de 6% de IPCA para este ano e 4,1% para o ano que vem –  consideravelmente acima do consenso, dado que o Boletim Focus mostra projeções de 4,6% e 4,1%, respectivamente. Já para Selic, as projeções são de 11,75% e 12%, respectivamente – e Dolle ainda ressalta que o viés de revisão é altista, ou seja, se a projeção for revisada, provavelmente será para cima.

Outras opções no Tesouro Direto

O Tesouro Direto também oferece outros títulos relativamente atrativos para investidores que não apostem numa elevação da inflação ao longo dos próximos dias, como o Tesouro Prefixado 2027, que tem uma rentabilidade ao ano de 13,23%. Um investimento de R$ 100 mil viraria R$ 129 mil em três anos – rentabilidade acima do CDB, Poupança e LCAs/LCIs. Veja abaixo algumas das opções disponíveis:

Rentabilidade dos títulos do Tesouro Direto
Rentabilidade dos títulos do Tesouro Direto (Crédito:Reprodução/Tesouro Nacional)

Comparativamente, o CDB (que é recomendado para reservas de de emergência com frequência, quando com liquidez diária) transformaria R$ 100 mil em cerca de R$ 120 mil na mesma janela, com um risco razoavelmente menor.

Patamar atual de remuneração é raro

Oswaldo Meireles, planejador financeiro CFP e sócio da Eu me banco, comenta que esse nível de remuneração por títulos do Tesouro só foi vista duas vezes nos últimos dez anos, em 2015 com a perda do grau de investimento do Brasil nas agências de classificação de risco e em 2016 com impeachment.

“Foram momentos de muita incerteza na Economia e na trajetória das contas públicas. Quem teve estômago para segurar os títulos nas marcações negativas de curto prazo, colheu bons frutos nos próximos 3 a 5 anos com os juros desses papéis caindo após a entrega do teto de gastos e reformas importantes para o crescimento do país”, afirma.

“O cenário atual pode ter algumas semelhanças pela condução da política fiscal expansionista, o que abre oportunidade de investimento para quem tem liquidez e também perfil para comprar títulos IPCA + 7%, visto que, o que está bom pode ficar ainda melhor”, avalia.

Importante destacar que a rentabilidade dos títulos do Tesouro não é ‘linear’; há volatilidade no meio do caminho, dado que os títulos marcam na curva. Ou seja, caso o investidor deseje vender os títulos antes do seu vencimento, receberá o quanto o mercado está disposto a pagar naquele momento – podendo então ter uma rentabilidade aquém do esperado ou até mesmo prejuízo.

Dolle, da XP, explica que quanto mais longo é o prazo mais sensível é o ativo. Portanto, é necessário ficar atento ao tipo de indexador.

“Olhamos uma duration de 4 anos, mas esse investidor tem que saber que o IPCA vai oscilar, não se deixar levar por uma taxa muito atraente e desconsiderar o indexador do ativo; tem que ser algo palpável. Eu traria atenção não só para a taxa mas que tem por trás, que é bastante risco”, alerta.

Mercado espera ação do Banco Central

Recentemente, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, declarou que considera a inflação ‘desancorada’ e cobrou novas medidas do lado fiscal que ajudem a autoridade monetária a ter uma postura menos austera.

O cenário é refletido na alta mais acentuada dos juros na última reunião do Copom e na perspectivas de novas elevações na Selic.

Cassiana Garcia, planejadora financeira e sócia-fundadora da The Hill Capital, comenta que as projeções para a Selic sinalizam uma inflação batendo no teto, mas que não espera que isso sinaliza um problema grande uma vez que o BC deverá agir para “deixar os juros em patamares mais altos para não gerar uma maior inflação”.

“Eu acho que a inflação não vai ser um problema. O problema que vai talvez mexer ainda mais nesses títulos seria o prêmio, e não o IPCA em si, porque no prêmio está embutido o risco fiscal”, afirma.

Opções além do Tesouro Direto

Para investidores que estão olhando para os patamares de remuneração dos títulos, vale lembrar que há opções além do Tesouro Direto. Garcia comenta que, particularmente, prefere títulos isentos de imposto, de emissores com rating AAA e com prazos de até 10 anos.

Ao se referir a títulos isentos, a especialista se refere a:

  • Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs)
  • Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs)
  • Letras de Crédito Imobiliário (LCI)
  • Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs)
  • Debêntures incentivadas

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