Seca e queimadas impactam preço de hortifrutigranjeiros

Seca e queimadas impactam preço de hortifrutigranjeiros
Com banca no Mercado Municipal, o comerciante Carlyle Barros cita a banana e a laranja como alimentos que ficaram mais caros nesse período de seca. Ele atribui o alto custo exatamente à falta de precipitações.  (Foto: Felipe Couri)

O início da primavera, no último domingo (22), marca o retorno das chuvas na Zona da Mata, de forma gradual, a partir de outubro. Mas o longo período de seca, que ainda deve perdurar por mais alguns dias, impacta o preço de alguns alimentos, sobretudo de frutas, como o abacate, que chegou a ter 150% de aumento em Juiz de Fora. Embora a escassez hídrica e as temperaturas acima da média influenciem, além de outros setores, todo o agronegócio, especialistas ouvidos pela Tribuna dizem que ainda não é possível mensurar o quanto a situação vai pesar no bolso dos consumidores e nos índices inflacionários. Quedas nas produções de itens como café, laranja e açúcar já influenciam altas no mercado internacional. Enquanto isso, feirantes da cidade sentem no dia a dia o quanto a situação climática tem afetado as vendas e mudado hábitos.

Segundo o comerciante José Carlos da Silva, proprietário da Banca do Zé, no Bairro São Pedro, Cidade Alta, os alimentos que ficaram mais caros neste período de seca foram limão, maracujá, abacate e pepino japonês. “As verduras sofrem com a seca, mas não tiveram aumento ainda”, pondera. As maiores altas foram do abacate e do pepino japonês, que atingiram 150%. O primeiro custava R$ 5,99 o quilo e está R$ 14,99, enquanto o segundo era R$ 3,99 e chegou a R$ 9,99. Em seguida vem o maracujá, que passou de R$ 7,99 o quilo para R$ 14,99, um acréscimo de 87,6%. Por fim, o limão tinha o preço de R$ 3,99 e sofreu reajuste de 75%, chegando ao valor de R$ 6,99.

Com isso, o feirante sofre com a perda de mercadorias. “Por dispararem os preços, os clientes deixam de comprar, e o prejuízo é maior”, comenta. A expectativa, conforme ele, é que as altas nos preços continuem. “Agora começa o período de chuva e achamos que será pior, pois produtos mais essenciais, como batata e tomate, vão disparar. A seca atinge menos do que a chuva em excesso”, avalia.

Com banca no Mercado Municipal, o comerciante Carlyle Barros também aponta os mesmos alimentos como os vilões do bolso no momento. Ele ainda acrescenta banana e laranja à lista. “O saco da laranja subiu R$ 20 e está custando R$ 80. O abacate foi de R$ 100 para R$ 180 a caixa. A banana prata não podia estar passando de R$ 50, R$ 60 a caixa, mas está de R$ 80 a R$ 100.” Ele atribui o alto custo exatamente à falta de precipitações. “O cacho não vinga, custa evoluir. A produção caiu muito. Onde podiam colher 10 caixas, estão colhendo cinco.”

De acordo com o feirante, os consumidores evitam comprar os itens mais inflacionados, optando por outros mais em conta, como o mamão e a melancia, ou reduzem a quantidade. Carlyle, entretanto, está otimista com a aproximação do período chuvoso. “Assim que começar a chover, deve dar uma melhorada. A chuva do fim de semana já ajudou um pouquinho, mas estamos precisando de mais.”

Excesso de chuvas também causa problemas

Economista do Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (IPEAD/UFMG), Diogo Santos avalia que vive-se as condições climáticas mais adversas, não só pela seca e pelas queimadas atuais. “Já nos últimos anos, elas afetam sim o preço de alimentos, de maneira diferenciada, porque há alimentos que acabam sendo menos prejudicados por conta de períodos menos chuvosos, mas são mais prejudicados quando há excesso de chuvas, por exemplo.”

Ele cita a banana e a laranja como exemplos de frutas com a produtividade dos pés afetada, produzindo menor quantidade, com qualidade inferior ao padrão. “Isso por conta da falta de equilíbrio nas condições climáticas típicas de cada época, de cada fruta. Quando há um excesso de chuvas, gera mais umidade, e isso ajuda a proliferar algumas doenças nos pés. Portanto, prejudica a colheita e a quantidade ofertada. Isso vai gerar uma pressão de aumento do preço, porque a demanda vai continuar a mesma, apesar de a oferta ter diminuído.”

O especialista comenta que alimentos negociados internacionalmente, como café, soja, açúcar, cacau, arroz e feijão, também sofrem impactos importantes. “Mesmo aqueles países que não sofreram com condições adversas, podem ter aumento de preço.” Ele cita o café, que teve baixa produção na Ásia desde o ano passado. “Isso gerou um aumento do preço no mundo inteiro porque, com a menor oferta, outros países passaram a ter uma pressão maior para ofertarem seus produtos no mercado internacional. Há cerca de um ano tivemos o aumento considerável do preço do café no Brasil. Isso ocorreu também no caso do arroz, com uma quebra de safra importante na Índia, que é a principal exportadora de arroz do mundo.”
Para o economista, ainda não é possível mensurar o tamanho do impacto que as queimadas e a seca excessiva podem causar nas commodities agrícolas.

“Não é possível dizer agora o quanto vão gerar de problema no sentido de aumento de preços. Sem dúvida, esses impactos chegam ao IPCA, mas às vezes chega de modo positivo, reduzindo.” Ele exemplifica o tomate, que teve queda considerável no valor em Belo Horizonte, ajudando a reduzir a inflação dos alimentos, “justamente porque houve uma concentração maior de fatores climáticos que ajudaram o fruto a amadurecer mais rapidamente, aumentando a oferta em um período curto de tempo”. Por outro lado, frutas com maior sensibilidade às condições climáticas podem ter influência negativa no índice de inflação e no custo de vida.

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Cotação internacional de café, laranja e cana aumenta

O pesquisador do Centro de Agronegócios da Fundação Getulio Vargas (FGV Agro)  doutor em Economia pela Fundação Getulio Vargas (FGV/SP), Felippe Serigati, afirma que o fato de um alimento ficar mais caro, em geral, não demanda reajuste em nenhum outro setor. Além disso, não é nem mesmo garantido que eles ficarão mais caros para o consumidor brasileiro. Por fim, ele acredita que não serão os alimentos a exercerem maior pressão na inflação, no contexto de problemas climáticos.

O impacto exato é incerto, principalmente pela grande parte do país afetada, e varia de acordo com o que está nas lavouras no momento. De cultura temporária pode haver um pouco de trigo, e também há a terceira safra de feijão, que é importante, mas não concentra a produção brasileira, ressalta o pesquisador. Segundo Felippe, o foco é nas lavouras permanentes ou semipermanentes de agosto e setembro: café, pomares, com grande destaque para a laranja e a cana-de-açúcar. Nesses mercados, “de fato, a cotação no mercado internacional já reagiu”.

“O mundo está de olho no mercado climático aqui no Brasil, e essa seca pode trazer prejuízos. Por exemplo, você pode ter problemas na floração do café. Houve relatos de floração em alguns cafezais, só que, com temperatura média e escassez hídrica, a própria planta aborta essa floração, porque consome muito dela. Como a planta não está robusta para segurar essa floração, o café vem com menor qualidade, em menor quantidade. Algo semelhante acontece nos pomares. E da cana, vemos a influência, principalmente, na cotação do açúcar”, detalha.

Outras produções menores podem também ter sofrido influência, mas, pelos ciclos mais curtos, não serão de grande importância, como batata, cenoura, cebola e tomate. Apesar da cotação internacional, o consumidor brasileiro pode nem chegar a pagar mais caro, conforme o especialista: “O comércio, o varejo, de certa forma, como não operam com commodities e operam em mercados competitivos, têm resistência a repassar esse choque de custos. Ou seja, se o suco de laranja ficar muito caro, as pessoas mudam de estabelecimento”.

Com relação à cana-de-açúcar, outra preocupação descartada pelo economista é sobre o aumento de combustíveis: “Nosso mercado é muito mais condicionado pelo petróleo do que pelos biocombustíveis. Não é a gasolina respondendo ao preço do etanol, é o etanol respondendo ao preço da gasolina.”

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Expectativa de chuvas

O período seco ainda continua por alguns dias, mas não deve se prolongar por muito tempo, como explica a coordenadora do Laboratório de Climatologia e do Curso de Geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Cássia Martins Ferreira: “A maior atuação de sistemas atmosféricos, associada ao processo de convergência de umidade vinda da Amazônia, contribui com o período chuvoso no Sudeste”.

De acordo com a professora, durante o outono e o inverno na região é comum haver baixas precipitações, com ambas as estações bem próximas da média. Porém, neste ano, a maior diferença foi provocada pelas altas temperaturas, que predominaram por quase todo o período. Associado à baixa umidade, o solo perdeu mais água, e a vegetação vem sofrendo com isso durante todo esse tempo, ficando mais seca, desidratada e facilitando incêndios.

“A seca só deverá parar de ser sentida quando a chuva se tornar mais frequente, isto é, com mais dias consecutivos com precipitações, gerando, desta forma, maior armazenamento de água no solo e, portanto, disponibilidade hídrica para a vegetação, além de maior abastecimento aos cursos d’água, por exemplo”, antecipa a climatologista. Ela lembra que a previsão para o início da primavera é de um aumento gradual no volume total de chuvas e na quantidade de dias chuvosos, já que o período é de transição entre as características do inverno e o que virá no verão.

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