‘Uma arte colaborativa por essência’: Coletivo Agrupa faz mosaicos e murais por Juiz de Fora

Coletivo Agrupa

coletivo agrupa
Coletivo Agrupa leva arte colaborativa para Juiz de Fora (Foto: Arquivo pessoal)

São muitas mãos envolvidas. Exige tempo para fazer sentido. É preciso cortar as pastilhas, peça a peça, seja como caco livre, quadrado ou retangular, organizá-las para torná-las parte de algo maior. Não dá para misturar cores — para criar esse efeito, simples na pintura, é preciso trabalhar com gradientes de paletas e pensar quase com a mesma lógica dos pontilhistas. Fora os desafios para achar as cores desejadas e os materiais mais adequados para cada espaço. São muitas decisões em cada fase do processo, seja criando mosaicos menores ou aqueles em murais, que atualmente estão espalhados pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Parque da Lajinha e Jardim Botânico. É esse trabalho que o Coletivo Agrupa está fazendo: algo que vai na contramão das tendências massificadas e até mesmo das novas formas de expressão artística, voltando a atenção para uma técnica milenar, que pode datar até mesmo da Mesopotâmia Antiga. Com coordenação dos professores Ricardo Cristofaro e Valéria Faria, do Instituto de Artes e Design (IAD/ UFJF), são 12 pessoas envolvidas nessa forma de arte, em um grupo artístico que também trabalha com as frentes de pesquisa e ensino.

O projeto começou em 2017, quando Ricardo, professor na área de escultura e tridimensional do instituto, recebeu o contato de Helgan Noly e Leonardo Paiva, mosaicistas de Juiz de Fora. Juntos, eles perceberam uma lacuna nos trabalhos e nas pesquisas com as diferentes linguagens artísticas. “À medida que as novas linguagens vão surgindo, tentamos incorporar essas experiências, como o que acontece na fotografia, vídeo e novas tecnologias. Mas também existem linguagens de uma tradição mais antiga, com mosaico, vitrais, afrescos, que vão sendo deixadas de lado. Mas a gente mantém essa ligação por pesquisa e afinidade. E Juiz de Fora teve, nos anos 50, muita tradição de mosaico”, conta Ricardo. 

O mosaico é, em sua definição, um ajuntamento de qualquer natureza sobre uma superfície. No caso do Coletivo Agrupa, isso é feito pela técnica indireta: o trabalho vai sendo feito em uma tela perfurada, em que as pastilhas são coladas, e depois a obra é recortada e reaplicada na parede. “Isso permite que a gente possa trabalhar de noite, em uma mesa grande, com várias pessoas juntas”, conta Ricardo. Em muitos casos, o projeto é pensado por um artista e pode ser executado por um técnico de mosaico, mas o grupo artístico dá conta de ambas as funções. No projeto das rampas de acessibilidade na UFJF, por exemplo, eles pensaram em como representar a pesquisa desenvolvida por meio do mosaico, e fizeram símbolos que justamente indicavam isso: foi o caso das conchas, representando o importante museu de malacologia do campus, assim como o acervo de artefatos dos indígenas Maxakalli. “Nosso mosaico representa as pessoas, a união dos saberes, as ciências e as artes, que são as frentes da universidade”, conta Valéria, também responsável pelo projeto. 

O grupo se reúne todas as terças-feiras para trabalhar, e atualmente também conta com quatro bolsistas do PIBIART. São meses, geralmente, para que as criações fiquem prontas, e muitas vezes também é preciso de uma semana inteira para a aplicação, mesmo com o uso da técnica indireta. Os maiores desafios, no entanto, são da captação de recursos financeiros. “A UFJF nos oferece o espaço, mas os insumos, como o porcelanato, o alicate, a argamassa, o rejunte e tudo que é preciso para fazer o mosaico adquirirmos com os nossos recursos”, conta Valéria. Um alicate que eles utilizam para cortar as pastilhas, por exemplo, chega a custar cerca de R$500. 

coletivo agrupa
Rampa da UFJF ganhou mosaico inspirado em pesquisas (Foto: Arquivo pessoal)

Memória em pedaços

A alternativa que também buscaram para financiar os projetos foi nos editais de cultura. É o que aconteceu quando fizeram a restauração de um mosaico do artista Guima, que ficava no antigo Colégio Magister. Esse trabalho tornou-se uma das frentes do Coletivo Agrupa: eles pesquisam as obras que já existiam em Juiz de Fora e buscam não só recriar e restaurar esses mosaicos, mas também chamar a atenção para a existência deles. Nomes como Niva Villela, Paulo Werneck, Alfredo Mucci e Ângelo Tanzini foram aparecendo nesse processo – e também obras importantes em áreas públicas da cidade, como é o caso do Bom Pastor e da Rua Halfeld.

É um trabalho também de encontrar essas memórias, em pedaços, e agrupá-las de outra forma, o que se parece com o mosaico que desenvolvem. No próprio Instagram, eles também chamam a atenção para como a técnica aparece na cidade, como é o caso das calçadas, com as pedras portuguesas. “A cidade tem um acervo considerável, com personalidades que foram importantes no cenário nacional. Pretendemos dar um pouco de continuidade nessa técnica, sabendo que existe esse histórico”, conta Ricardo. Eles também estão planejando a publicação de um livro sobre esse assunto.

Arte pública 

coletivo agrupa
Artistas trabalham com viés de ensino, pesquisa e extensão (Foto: arquivo pessoal)

Para os responsáveis pelo projeto, o que encanta no mosaico, principalmente o feito em grandes murais, é essa possibilidade de arrebatamento, como explica Valéria. “A arte chama a atenção, tira a gente da mesmice do cotidiano e leva pra outro lugar. (…) Quando eu viajo e vejo um painel desses, enormes, fico pensando o que levou os artistas e se envolverem nesse trabalho artístico e essa história das obras, que ficam para todos”, diz ela. Por ocuparem os espaços públicos, também é um trabalho, como observa Ricardo, que se diferencia da arte moderna feita para ficar dentro de galerias ou coleções particulares. 

Para ele, a cidade sempre foi o lugar da arte. ”Isso não é algo novo, é algo quase ancestral da arte. O artista sente vontade de atuar nesse lugar”, diz o professor. E o mosaico, diferentemente da pintura, tende a ser propício para esse lugar: “O  mosaico é feito com um material que permite que ele fique no tempo, receba luz, umidade ou chuva sem se deteriorar”, conta. Por isso, a expectativa também é de que as obras do grupo permaneçam como algo público, que perdure para além deles mesmos — o que também estão buscando nas oficinas de ensino para a população.

  • LEIA MAIS sobre Cultura aqui

O post ‘Uma arte colaborativa por essência’: Coletivo Agrupa faz mosaicos e murais por Juiz de Fora apareceu primeiro em Tribuna de Minas.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.