Com potencial para descarbonizar setores difíceis de eletrificar, como a indústria pesada, transporte de longa distância e siderurgia, o hidrogênio verde (H2V) tem emergido como uma peça-chave na transição energética global. Esse crescimento projeta um impacto significativo no mercado de trabalho, criando oportunidades de emprego e de grandes investimentos.
Um relatório da consultoria McKinsey aponta que até 2030, o país deve gerar cerca de 150.000 empregos diretos e indiretos no setor de hidrogênio verde. Até 2050, esse número pode chegar a 500.000 empregos, considerando o crescimento contínuo do setor.
De olho nesse mercado promissor, a Rede Brasileira de Certificação Pesquisa e Inovação (RBCIP), a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e a empresa de energia e sustentabilidade Green World Energy Hydrogen (GWE) firmaram um acordo de cooperação para instalar uma usina de hidrogênio verde, na Cidade Universitária da instituição de ensino, em Campo Grande.
O empreendimento vai atrair investimentos que podem passar de R$ 2 bilhões até 2030, com a produção de fertilizantes verdes. A iniciativa pioneira e inovadora no Estado de Mato Grosso do Sul e no Centro-Oeste do Brasil é voltada à produção de energia limpa e renovável, a partir da separação da molécula da água (H₂O), utilizando energia elétrica de fonte solar e água.
A usina posiciona a UFMS e o Mato Grosso do Sul na vanguarda da transição energética e da pesquisa em hidrogênio verde no Brasil, por meio do Laboratório Multiusuário de Estudos sobre o hidrogênio verde da UFMS – H2V+. Com capacidade de produção de uma tonelada de hidrogênio por mês, a usina é um piloto industrial e já está operando para demonstração e produção, integrando ensino, pesquisa, empreendedorismo e inovação na UFMS.
O professor Marcelo Fiche, coordenador do projeto na RBCIP, informa que para ajudar a reduzir um dos gargalos da atividade no Brasil, que é a carência de mão de obra especializada para operar as usinas de hidrogênio verde e seus derivados, 500 especialistas como professores e engenheiros serão capacitados nas instalações, por ano, para atuarem no mercado brasileiro e internacional. Ele acrescenta que o Brasil deve usar suas fontes naturais para produzir além do hidrogênio verde, produtos oriundos do H2V que gerem valor adicional na comercialização de commodities.
“Há uma tentativa de aproveitar a produção de hidrogênio para gerar maior valor agregado em produtos que o Brasil produz. Essa parceria da RBCIP com a UFMS e GWE defende que ao invés de exportar aço, o país pode vender para fora aço verde, amônia verde, hidrogênio verde, em substituição do cinza e agregar valor. Essa atividade resulta no nascimento da própria cadeia de produção de equipamentos na indústria, fortalecendo o setor no país. No mercado interno, existem oportunidades de descarbonização para diversos setores industriais importantes como cimento, aço, alimentício, fertilizantes, petroquímico, dentre outros”, afirma Fiche.
O CEO da Green World Energy Hydrogen (GWE), José Eduardo Cury Salemi, destaca que na usina, também serão feitos estudos de rotas importantes para o hidrogênio: o gás sintético, o diesel verde, chamado de HVO, o metanol verde, a amônia verde e os fertilizantes verdes. Além disso, serão realizados estudos EVTEA – de viabilidade técnica, econômica e ambiental.
“O objetivo desse trabalho é, também, tornar a usina um centro de excelência em pesquisas de hidrogênio verde no Centro-Oeste do país para que empresas privadas possam desenvolver suas pesquisas”, informa Salemi.
Um dos sócios da GWE, Israel Fernando França, explica que o projeto no Estado do Mato Grosso do Sul, onde o agro é muito forte, conta com investimento da empresa, que também investe no Estado de são Paulo, onde tem projetos em fase avançada, e se destaca pela expertise na engenharia de instalação de plantas de hidrogênio.
Ele acrescenta que a próxima etapa dos trabalhos da GWE, no mercado de sustentabilidade, é a conclusão da planta para produção de fertilizantes verdes, que deve ser anunciada até o início de 2026.
“A empresa está pronta para ser uma EPC. (sigla em inglês para Engineering, Procurement, and Construction, que em português significa: Engenharia, Suprimentos e Construção). Nós faremos o gerenciamento de projetos de construção integrada, que envolve a elaboração do projeto, aquisição de materiais e a construção de uma instalação. Esse modelo é amplamente utilizado em projetos de grande escala, como usinas de energia, refinarias de petróleo, projetos de infraestrutura e instalações industriais”, ressalta o empresário.
A reitora da UFMS, Camila Ítavo, afirma que a Usina de hidrogênio verde coloca a Ciência como a grande protagonista do desenvolvimento para o estado e para o país.
“É uma demonstração clara que a Universidade é celeiro de projetos inovadores que trazem transformações para a nossa sociedade, assumindo a vanguarda de relevantes discussões para o mundo. É um passo significativo que traz ainda a parceria público-privada para o seu sucesso. Além disso, o projeto piloto vai ampliar a formação de estudantes e oferecer capacitação para as indústrias e pesquisadores da região e de todo o país”, explica Camila.
O sistema de produção da usina é composto por painéis solares (geração de energia elétrica renovável), eletrolisador (equipamento que realiza a eletrólise da água, separando hidrogênio e oxigênio) e sistema de controle e monitoramento (que permitirá acompanhamento remoto e análise de dados para fins científicos e tecnológicos). O eletrolisador, de última geração, passou por Teste de Aceitação de Fábrica (FAT), na China, em colaboração com os principais fabricantes chineses. Eles validaram o desempenho, a eficiência e a segurança do eletrolisador, garantindo sua prontidão para implantação no Brasil.
Oportunidades de negócios
1. Blends de hidrogênio com biometano ou gás natural: pesquisa e testes com misturas sustentáveis para uso em geradores, veículos ou caldeiras.
2. Posto de abastecimento experimental: desenvolvimento de infraestrutura para abastecer veículos com hidrogênio e/ou biometano.
3. Desenvolvimento de células a combustível (fuel cells): projetos de inovação voltados à conversão de hidrogênio em energia elétrica para mobilidade ou geração estacionária.
4. Hidrogênio como vetor para fertilizantes verdes e combustíveis sintéticos: pesquisa sobre produção de amônia verde, metanol e e-combustíveis para o agronegócio e exportação.
5. Aplicações educacionais e demonstrações tecnológicas: criação de um “laboratório vivo” para visitas técnicas, projetos pedagógicos, eventos e exposições interativas.
6. Inovação aberta com startups: lançamento de desafios tecnológicos, editais e incubação de soluções energéticas no ecossistema de inovação da UFMS.
No Brasil
A fonte de energia limpa e sustentável pode gerar um faturamento de R$ 150 bilhões por ano no Brasil até 2050, sendo que R$ 100 bilhões seriam provenientes das exportações da commodity, segundo a pesquisa Green Hydrogen Opportunity in Brazil (Oportunidade de hidrogênio verde no Brasil, em português).
Um estudo internacional da consultoria alemã Roland Berger aponta que o Brasil tem potencial para se tornar o maior produtor mundial em hidrogênio verde. O país tem 87% da sua matriz energética oriunda de fontes renováveis como hidrelétricas, painéis solares e eólicas. Apesar disso, o Brasil ainda possui grande capacidade de expansão dessas fontes.
Produção mundial
Um estudo da Deloitte Brasil aponta que o comércio global de hidrogênio verde pode gerar mais de US$ 280 bilhões em receitas anuais de exportação até 2050. Em relação aos investimentos, mais de US$ 9 trilhões deverão ser injetados na cadeia global de abastecimento de hidrogênio limpo para ajudar no alcance do net zero até 2050. Desse total, cerca de US$ 3 trilhões serão investidos em economias em desenvolvimento.
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