Parceiros redefinem suas relações comerciais e de defesa 5 anos após britânicos deixarem o bloco europeu. Pacto viabiliza investimentos militares, reduz controles de fronteira e compartilha controle marítimo.Quase nove anos depois de ter votado pela saída da União Europeia, o Reino Unido chegou nesta segunda-feira (19/05) a um amplo acordo com o bloco que vai redefinir seus laços comerciais e de defesa.
O pacto reaproxima o Reino Unido da UE em meio à política protecionista do presidente americano Donald Trump e a pressão por uma maior coordenação militar europeia devido à guerra na Ucrânia. A proposta inclui um pacto de defesa, menos restrições aos exportadores de alimentos e turistas e um novo e polêmico acordo de pesca.
O acordo foi costurado pelo primeiro-ministro britânico Keir Starmer, que apoiou a permanência na UE quando houve o referendo do Brexit em 2016. A saída oficial do Reino Unido aconteceu em 2020.
Ao lado da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e do presidente do Conselho Europeu, António Costa, na Lancaster House, em Londres, Starmer disse que o acordo marca “uma nova era em nosso relacionamento”.
Para Von der Leyen, o pacto enviou uma mensagem. “Em um momento de instabilidade global, e quando nosso continente enfrenta a maior ameaça que já enfrentou em gerações, nós, na Europa, permanecemos unidos”, disse.
Esse é o terceiro acordo firmado por Starmer neste mês, depois de negociações com a Índia e os EUA.
O que diz o acordo
Em vez de buscar um retorno total a um pilar da UE, como o mercado único, por medo de irritar os eleitores conservadores, Starmer procurou negociar um melhor acesso ao mercado em algumas áreas – uma medida que é frequentemente rejeitada pela UE como uma “escolha seletiva” dos benefícios da UE sem as obrigações de associação.
No centro da redefinição está um pacto de defesa e segurança que permitirá que a Grã-Bretanha faça parte de qualquer aquisição conjunta de produtos militares com a UE e abrirá caminho para que empresas britânicas, como BAE, Rolls-Royce e Babcock, participem de um programa de 150 bilhões de euros (US$ 951 bilhões) para rearmar a Europa.
Isso permitirá que o Reino Unido obtenha empréstimos baratos com o apoio do orçamento da UE para comprar equipamentos militares, em parte para ajudar a Ucrânia a se defender.
A UE afirmou que o programa de empréstimos ajudará a aumentar a prontidão da defesa europeia, além de permitir um apoio mais coordenado à Ucrânia.
O Reino Unido também defende que o pacto vai reduzir a burocracia para os produtores agrícolas britânicos, melhorar a segurança energética e, até 2040, acrescentar quase 9 bilhões de libras (R$ 67 bilhões) à economia.
Imigração e pesca no centro da discussão
Starmer também incluiu nas negociações demandas populares dos britânicos, como um sistema de imigração mais ágil para cidadãos que se deslocam à União Europeia. Além disso, assegurou a redução permanente da burocracia e dos controles de fronteira que dificultavam a exportação de produtos por pequenos produtores de alimentos.
A ideia é contornar problemas como a fila de caminhões que esperam por horas nas fronteiras com alimentos frescos que não podem ser exportados automaticamente para a UE devido às complexas certificações pós-Brexit.
As mudanças também permitem ao Reino Unido voltar a vender produtos como hambúrgueres britânicos crus, salsichas e frutos do mar para a UE. Os benefícios se aplicam à Irlanda do Norte, onde os controles alfandegários pós-Brexit têm sido um problema há anos.
Tais medidas, no entanto, exigiram que o Reino Unido aceitasse uma cláusula polêmica relacionada ao setor pesqueiro. De acordo com o tratado, embarcações britânicas e da União Europeia terão acesso mútuo às respectivas águas pelos próximos 12 anos.
Embora a pesca tenha um impacto econômico menor para o Reino Unido, o controle britânico sobre suas águas territoriais é considerado um de seus principais trunfos comerciais frente à Europa, tendo sido, inclusive, um dos temas centrais nas negociações do Brexit. É uma questão simbolicamente importante para o Reino Unido, que disputa o controle comercial marítimo com estados-membros da UE, como a França.
Também foi incluída uma cláusula que permitirá a jovens britânicos e europeus viver e trabalhar nos territórios uns dos outros por períodos determinados, cujos detalhes ainda serão definidos. O governo britânico também está em tratativas para retomar sua participação no programa de intercâmbio estudantil Erasmus+.
Críticas dos opositores
O acordo foi questionado pelo Partido Conservador, oposicionista que estava no poder quando o Reino Unido deixou o bloco e passou anos negociando o Brexit. Segundo membros da legenda, o Reino Unido agora terá que aceitar as regras da UE.
Nigel Farage, líder do partido de ultradireita pró-Brexit Reform UK, chamou o pacto de “rendição abjeta – o fim do setor pesqueiro”. A Scottish Fishermen’s Federation (Federação Escocesa de Pescadores) também acusou o texto de ser um “show de horrores”, pois os pescadores da UE poderão acessar as águas britânicas por muito mais tempo do que o esperado, pressionando a competição.
Críticos também veem o plano de mobilidade para jovens e profissionais como um retrocesso em direção à antiga circulação livre de pessoas, que permitia cidadãos da UE se mudarem para o Reino Unido
Já Chris Curtis, membro do Partido Trabalhista, argumenta que o pacto corrigiria alguns dos problemas criados pelo acordo original dos conservadores pós-Brexit e disse acreditar que a maioria das pessoas queria melhores relações.
“É muito fácil fingir que não há compensações, que você pode conseguir tudo o que quer e não precisa abrir mão de nada, mas isso é claramente uma balela”, disse ele à Reuters.
Economia britânica em risco
A saída do Reino Unido da UE ajudou a desencadear um dos períodos mais tumultuados da história política britânica e gerou ruídos nas relações com Bruxelas. Cinco primeiros-ministros assumiram o cargo antes da chegada de Starmer em julho passado.
As pesquisas mostram que a maioria dos britânicos agora se arrepende de seu voto pelo Brexit.
Apesar do acordo, a economia do Reino Unido continuará significativamente diferente do que era antes de deixar o bloco. O Brexit custou milhares de empregos ao centro financeiro de Londres, pesou sobre a produção do setor e reduziu suas contribuições fiscais, segundo estudos.
Embora a UE seja o maior parceiro comercial do Reino Unido, o país foi atingido por uma queda de 21% nas exportações desde o Brexit devido à burocracia mais onerosa e a outras barreiras não tarifárias.
gq (reuters, ap)
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