
Por Professor Caverna
Quando pensamos em René Descartes, a primeira coisa que vem à cabeça é aquela famosa frase: “Penso, logo existo.” Clássica, né? Mas a real é que o raciocínio de Descartes vai muito além desse bordão filosófico que a gente vê em meme de internet. Ele não só queria provar que ele próprio existia, ele também queria provar que Deus existia. E não era apenas porque ele era religioso, mas porque, para ele, sem Deus a coisa toda não se sustentava. Antes de entrar na discussão sobre Deus, a gente precisa entender a vibe do projeto cartesiano. Descartes, lá no século XVII, olhou para o mundo e viu uma bagunça intelectual.

Filosofia, ciência, religião… tudo parecia misturado, cheio de certezas frágeis. Então ele propôs: “Vamos duvidar de tudo para ver o que sobra.” Esse processo ficou conhecido como dúvida metódica. A lógica é mais ou menos assim: se eu posso imaginar que estou sendo enganado por um sonho, por ilusões, ou até por um “gênio maligno” (ideia maluca, mas importante no pensamento dele), então eu não posso confiar nos meus sentidos, nem nas tradições, nem nos raciocínios comuns. Só que tinha uma coisa que ele não conseguia duvidar de jeito nenhum: o fato de que ele estava pensando. E se ele pensa, então ele existe. Daí nasce o tal do “Cogito, ergo sum”, “Penso, logo existo.” Beleza, até aqui, tudo certo. Mas… como é que a existência dele próprio leva à existência de Deus? É aí que a história esquenta.
Depois de concluir que ele mesmo existe, percebeu que precisava ir além. Se tudo pode ser colocado em dúvida, como eu sei que o mundo fora da minha cabeça é real? Como eu confio que a matemática, as ciências, o próprio raciocínio, têm alguma validade? Para o pensador, sem a garantia de algo perfeito e infalível, tudo poderia ser fruto de um engano. E quem poderia dar essa garantia? Só Deus. Em outras palavras: se Deus não existisse, eu poderia ser permanentemente enganado por um gênio maligno. E aí não dá para construir conhecimento sólido. Então, provar que Deus existe era essencial para a arquitetura racional de Descartes. Mas ele não queria apelar para a fé. Não bastava dizer “eu acredito”; ele queria uma prova racional.
Uma das sacadas mais interessantes que Descartes propôs foi a chamada prova ontológica da existência de Deus. A lógica dele é mais ou menos assim: Dentro da mente humana existe a ideia de Deus, um ser supremo, infinito, todo-poderoso e perfeito. Ora, eu sou um ser imperfeito, limitado. Então, de onde veio essa ideia de algo tão maior do que eu? Como um ser imperfeito não poderia, sozinho, inventar a ideia de um ser infinitamente perfeito, essa ideia só pode ter vindo de alguém que realmente possua todas essas perfeições, ou seja, do próprio Deus. Logo, Deus existe. Simplificando muito: para Descartes, ter a ideia de Deus dentro de si é como encontrar a assinatura de um artista numa obra de arte. A marca da autoria está lá. A existência de Deus seria tão clara quanto uma prova matemática, se a gente raciocinasse direito.
Hoje, muita gente acha essa linha de raciocínio meio forçada. Alguns filósofos contemporâneos até dizem: “Pô, Descartes, só porque eu tenho uma ideia de unicórnio não significa que unicórnios existem!” E essa crítica tem seu peso. Só que é importante entender que, para Descartes, Deus não é só um conceito inventado; é uma ideia que carrega em si a marca da realidade. Além disso, o raciocínio cartesiano se apoia numa distinção que ele faz entre tipos de ideias: Algumas ideias vêm de fora (como a visão de uma árvore, por exemplo). Outras são inventadas (tipo imaginar um dragão). Mas algumas ideias são inatas já estão dentro de nós desde sempre. E a ideia de Deus seria desse terceiro tipo: algo tão natural e tão inevitável que não poderia ser explicado apenas pela imaginação.
Descartes também diz que Deus não só existe, mas também é o garantidor da verdade. Como assim? Olha só: se Deus é infinitamente bom e perfeito, então ele não iria nos enganar. Isso significa que, quando usamos a razão de maneira adequada (com atenção, sem pressa, sem erros de cálculo), podemos confiar que estamos chegando à verdade. Sem essa confiança na razão, a ciência moderna não poderia nem começar. Aliás, dá para ver aqui a importância histórica de Descartes para o nascimento da ciência moderna. Ao colocar Deus como a peça que assegura a validade do conhecimento, ele pavimentou o caminho para que o raciocínio científico pudesse se desenvolver com mais segurança.
Se Deus não existisse ou se fosse um Deus enganador, então não daria para confiar nem no 2+2=4. Nem nas leis da física. Nem na própria existência do mundo exterior. Tudo poderia ser uma pegadinha cósmica. É por isso que provar a existência de Deus não era, para Descartes, apenas um exercício de fé ou de devoção. Era uma questão filosófica central para a sobrevivência do conhecimento racional. Sem Deus, o castelo de cartas da filosofia desmoronaria de novo.
Mesmo quem discorda de Descartes reconhece: ele mudou o jogo. Antes dele, a filosofia medieval girava muito em torno da autoridade da Igreja, dos textos sagrados e da tradição. Com Descartes, a aposta muda: o ponto de partida passa a ser a razão individual.
E olha que curioso: mesmo apelando para Deus, Descartes inaugura uma filosofia que é muito mais racional do que tradicional. É o indivíduo pensando por conta própria, sem depender de dogmas. O espírito do Iluminismo, que viria logo depois, bebeu muito dessa fonte. O próprio avanço da ciência moderna, que preza a dúvida, a experimentação e a comprovação lógica, tem uma dívida enorme com a atitude cartesiana.
Claro que, como todo grande pensador, Descartes enfrentou críticas. Uma das mais famosas é a de que ele meio que dá uma “volta” para trazer Deus de volta à conversa. Tipo assim: primeiro ele diz que vai duvidar de tudo. Depois ele descobre que pensa, então existe. Mas logo em seguida ele traz a existência de Deus como uma necessidade para poder confiar no próprio pensamento. Parece que ele dá uma apelada, né?
Outro ponto de crítica é a prova ontológica em si. Filósofos como Kant vão dizer que existência não é uma propriedade que você pode simplesmente atribuir a uma ideia. Ter a ideia de algo não implica que esse algo exista de verdade. Além disso, existe a famosa questão da circularidade: alguns acusam Descartes de cometer um “círculo vicioso”, porque ele confia na razão para provar Deus, mas precisa de Deus para confiar na razão. Apesar dessas críticas, ninguém tira de Descartes o título de revolucionário.
À primeira vista, toda essa discussão pode parecer meio cabeça demais, meio século XVII demais. Mas pensa bem: em plena era digital, cheia de fake news, inteligência artificial, deepfakes e teorias da conspiração, saber em quem e em que confiar nunca foi tão importante.
A dúvida metódica de Descartes ensina que é saudável questionar. Mas também que é preciso encontrar um chão firme para construir nosso conhecimento. Talvez hoje a gente não use Deus como esse chão, talvez sejam a ciência, a razão crítica, o debate aberto. Mas o espírito cartesiano continua vivo: duvidar, investigar, buscar a certeza de maneira honesta. E, convenhamos, essa é uma atitude que faz falta nos tempos atuais.
Descartes não queria só provar que Deus existe. Ele queria garantir que o ser humano pode conhecer o mundo de forma segura. Deus era a âncora para essa confiança.
Mesmo que a gente, hoje, não siga o mesmo caminho dele, o legado permanece: a coragem de recomeçar do zero, de enfrentar a dúvida, de usar a razão como ferramenta para não se perder na selva de informações. No fim das contas, Descartes nos deu mais do que argumentos sobre a existência divina. Ele nos deu uma bússola para navegar pela vida.
–
Convite Especial: Café Filosófico – Reflexões para Pais e Filhos
Prezadas famílias!
Temos o prazer de convidá-los para o V Café Filosófico, um encontro especial onde pais e filhos poderão compartilhar um momento de reflexão e diálogo sobre os dilemas da vida.
Em um mundo repleto de desafios e mudanças constantes, criar espaços para conversas significativas fortalece os laços familiares e amplia nossa visão de mundo. Neste evento, vamos explorar juntos questões que nos fazem pensar, crescer e nos conectar de maneira mais profunda.
Por que participar?
✔ Fortaleça a relação com seu filho(a) por meio do diálogo
✔ Reflita sobre valores, escolhas e desafios da vida
✔ Compartilhe ideias em um ambiente acolhedor e inspirador
_
Data e local: 11 de outubro às 17:37hs no Zeppelin
Contaremos com um ambiente descontraído e um delicioso café para tornar este momento ainda mais especial!
Venha viver essa experiência enriquecedora conosco! Sua presença fará toda a diferença.
Esperamos você e sua família!
–
Ingressos para o V Café Filosófico:

https://cafefilosoficoo.lojavirtualnuvem.com.br/produtos/1-lote-ingressos
Comunidade do “Café Filosófico” no WHATSAPP:

https://chat.whatsapp.com/Ewehn3zxEBr6U0z96uZllP
–
Obs. Caro leitor, o objetivo aqui é estimular a sua reflexão filosófica, nada mais! mais nada!
E aí, curtiu a ideia geral? Deixe seu comentário logo abaixo.
O post Rene Descartes e Deus apareceu primeiro em Últimas Notícias de Foz do Iguaçu e Região – H2FOZ.