‘Mr. Payback’ – Os 30 Anos do Filme Interativo que não deu certo nos Cinemas! Você já tinha ouvido falar?

A sétima temporada de ‘Black Mirror’ está entre nós e já é um dos maiores sucessos de audiência da Netflix nessa temporada. Os fãs fiéis do programa conhecem todos os detalhes dos episódios e certamente assistiram a todas as possibilidades do filme interativo que leva o título da série. Sim, ‘Black Mirror’ teve um filme interativo, você lembra? ‘Bandersnatch’ foi lançado em 2018 e tinha como proposta diversas possibilidades de narrativa em suas 1h30min de projeção. Mas e seu te disser que esse não foi o primeiro filme interativo e que há 30 anos a proposta foi levada aos cinemas. Hoje vamos conhecer ‘Mr. Payback‘.

O ano era 1995. O Windows 95 era lançado. O primeiro Playstation era lançado. No Brasil, o Real, então uma nova moeda, entrava em seu segundo ano de atividade e Fernando Henrique Cardoso assumia como presidente. No mundo da música, o grupo TLC lançava a canção “Waterfalls”, Michael Jackson lançava “You are Not Alone”, Madonna lançava “Take a Bow”, Seal lançava “Kiss from a Rose” e Coolio lançava “Gangsta’s Paradise” (ambas trilhas sonoras de filmes famosos). Na TV, ‘Friends’ e ‘Plantão Médico’ iam para o seu segundo ano. E no cinema, sucessos como ‘Toy Story’, ‘Jumanji’, ‘Seven’, ‘As Patricinhas de Beverly Hills’, ‘Os Bad Boys’ e ‘Batman Eternamente’ estreavam nas telonas.

‘Mr. Payback’ era vendido como o primeiro filme interativo.

Ao lado de tantos filmes marcantes e sucessos de bilheterias, um produtor achou ter encontrado a nova tendência que ditaria moda na indústria. Essa era a época da revolução da informática. Computadores e a internet começavam a fazer parte de nossa rotina, mesmo que de uma forma ainda tímida (principalmente aqui no Brasil). O mundo virtual começava a aparecer (embora a grande maioria sequer soubesse do que se tratava). Tivemos, por exemplo, a primeira animação inteiramente criada através de efeitos de computadores na terceira dimensão, com ‘Toy Story’, que revolucionaria para sempre não só o gênero, como a indústria do cinema e audiovisual.

O cinema de forma geral dava às boas-vindas para a “era dos computadores”, usando como tema em diversas produções o admirável novo mundo que se apresentava diante de nós. ‘A Rede’, ‘Hackers – Piratas de Computador’, ‘Estranhos Prazeres’, ‘Johnny Mnemonic – O Cyborg do Futuro’ e ‘Assassino Virtual’ eram alguns dos filmes que utilizaram a temática do mundo computadorizado e virtual em suas tramas. Até mesmo filmes de ação como ‘A Força em Alerta 2’, ‘Congo’, ‘007 Contra GoldenEye’ e o anime ‘Ghost in the Shell’ utilizavam em alguma capacidade o tema, desde computadores capazes de controlar satélites, até gerar voz para a linguagem de sinais dos gorilas.

Com ‘Mr. Payback’ as pessoas não assistiam apenas, mas participavam do filme – anos antes das cantorias de ‘Wicked’ e do infame “Chicken Jockey”.

No meio dessa revolução estava o produtor Jeremiah Samuels, renomado na área tendo trabalhado em filmes como ‘X-Men: Primeira Classe’ e ‘Olhos da Justiça’. Samuels gostou e resolveu bancar a ideia de Bob Gale, ninguém menos que o criador o clássico ‘De Volta para o Futuro’ (1985). Sempre à frente de seu tempo, Gale roteirizou e dirigiu ‘Mr. Payback’, um conceito que unia cinema e videogame, surgindo como o filme interativo que era a cara do futuro…, isto é, ao menos para 1995.

E bem, Bob Gale concretizou sua ideia e realmente a levou aos cinemas. Ao menos para a sua terra natal, os EUA. Acontece que, como você deve imaginar, a ideia não vingou como planejado e é justamente por isso que você e a maioria nunca haviam ouvido falar de ‘Mr. Payback’. Isso embarreirou a entrada da ideia em outros países como o Brasil, por exemplo.

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De fato, nem sequer podemos chamar ‘Mr. Payback’ de filme, ou melhor, de longa-metragem, já que se tratava de uma “experiência” de apenas 30 minutos nas telonas. Ou seja, era praticamente um simulador. Funcionava da seguinte forma: ao adentrar o cinema, o espectador recebia uma espécie de controle, que deveria ser ativado em momentos determinados do filme. Em cenas específicas, uma mensagem aparecia na tela, dando a opção de três alternativas para o protagonista prosseguir, e cabia ao público decidir sobre qual caminho ele deveria escolher. Ideia parecida vem sendo utilizada atualmente em programas de auditório inclusive aqui no Brasil, como programas musicais.

A opção mais votada pelos membros da plateia era a atitude tomada pelo protagonista para dar continuidade à história. E bem, qual era essa história? Ela seguia o ator Billy Warlock, famoso pela série ‘Baywatch – S.O.S. Malibu’. Ele interpreta o protagonista Payton, também conhecido como ‘Mr. Payback’ – ou ‘Sr. Vingança’. Pense numa espécie de ‘Relatos Selvagens’ no qual você controla o personagem dando o troco em maus cidadãos de todas as espécies. No filme, o protagonista encontra todo tipo de pessoa mal-educada, rude, egoísta e que comete pequenas infrações de forma geral sem se importar com o próximo. São aquelas situações do dia a dia nas quais ficamos a ponto de explodir, e o sr. Payback faz esse papel, não apenas explodindo, como tomando uma atitude em nosso nome. Cabia ao espectador decidir qual punição ele deveria aplicar ao sem-noção.

Billy Warlock era o protagonista, um androide que se vingava dos cidadãos mais sem-noção.

Ah sim, e se você gostasse da brincadeira poderia ficar para outras sessões. Pelo fato de a projeção durar apenas meia hora, o ingresso dava direito ao espectador ficar para próximas exibições a fim de assistir a novas possibilidades de vingança, até assistir a todas (caso tivesse curiosidade). Além do protagonista Warlock, o “filme” contava ainda com nomes famosos em seu elenco, como Christopher Lloyd (‘De Volta para o Futuro’), Leslie Easterbrook (‘Loucademia de Polícia’) e Bruce McGill (‘Clube dos Cafajestes’).

Apesar da ideia criativa, ‘Mr. Payback’ não foi para frente e ficou estacionado lá em 1995. O “filme” foi detonado pela crítica, que considerou o humor contido na história como sendo de baixo nível e que a ideia dava vazão a nossos desejos mais sádicos – afinal existia a possibilidade da vingança social contra membros de gangues, ladrões de bicicletas e motoristas que param em vagas para deficientes, etc.

Até Christopher Lloyd participou do filme interativo ‘Mr. Payback’.

O grande crítico Roger Ebert chegou a incluir ‘Mr. Payback’ em primeira posição como o pior filme de 1995. Segundo ele, “não queremos interagir com um filme, queremos que ele haja em nós. Queremos nos perder nele. Se tivermos que tomar as decisões, deviríamos ser pagos e não o roteirista. Se quisermos interagir, podemos fazer isso nos fliperamas no lobby dos cinemas”.

Mr. Payback’ não deu certo e não criou tendência, mas certamente foi homenageado muitos anos depois por ‘Black Mirror’, a série que é sinônimo de tecnologia dando errado e sendo usada contra nós. Será que foi uma ironia?

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