
Crítica livre de spoilers.
‘Star Wars’ é uma das franquias mais populares da história do entretenimento – já tendo originado uma quantidade considerável de longas-metragens, animações e séries de televisão que continuam explorando tramas e subtramas desse universo em constante expansão. E, em meio a títulos ótimos e frustrantes, é notável como ‘Andor: Uma História Star Wars’ chama nossa atenção ao se configurar como uma das melhores e mais ambiciosas entradas desse panteão.
Tendo estreado em 2022, a temporada de estreia conquistou o público e a crítica ao apoiar-se nos tropos da clássica jornada do herói cunhada por Joseph Campbell ao nos levar para os eventos anteriores ao elogiado filme ‘Rogue One’ e narrando de que forma o outrora ladrão e caçador de recompensas Cassius Andor (Diego Luna) se transformou em um dos grandes emblemas da Aliança Rebelde contra o crescente fascismo do Império Galáctico. A princípio preocupando-se apenas com sua própria sobrevivência e cético em relação às constantes e falhas investidas contra o governo, Cassius logo se viu no centro de uma revolução necessária que despertou em seu âmago um levante perigoso e mandatório.
Agora, somos convidados para uma antecipadíssima segunda iteração, cujos três primeiros episódios chegam ao catálogo do Disney+ no dia de hoje, 22 de abril. É claro que nossas expectativas estavam lá em cima com o iminente prospecto dos capítulos inéditos, talvez com um certo receio de que as promessas não fossem cumpridas; felizmente, o showrunner e criador Tony Gilroy uniu-se com um time incrível de roteiristas e diretores para permanecer fiel à identidade explorada no ciclo anterior, ampliando as complexas subtramas políticas e sociais à medida que reacendeu o motivo pelo qual todos nos apaixonamos por ‘Star Wars’ há tantas décadas – ou recentemente, considerando a vinda de novas gerações que cruzariam caminho com esse universo.
Aqui, é notável como Gilroy e sua equipe se preocupam com os mínimos detalhes para fornecer uma perspectiva diferenciada da saga sci-fi, por assim dizer. Enquanto Campbell foi utilizado como base para as origens do protagonista titular nos capítulos anteriores, lidamos com uma remodelagem de convencionalismos que transforma a atmosfera em um barril de pólvora prestes a explodir: de um lado, Cassius, agora parte oficial da rebelião, precisa encontrar o que sobrou daqueles que ama enquanto luta com demônios próprios e um obstáculo que, de fato, não estava em seus planos; Mon Mothma (Genevieve O’Reilly), Luthen (Stellan Skarsgard), Vel (Faye Marsay) e tantos outros continuam a agir às escondidas para recrutar mais nomes para a Aliança e em detrimento do contínuo reinado de caos do Império; e Bix (Adria Arjona) recupera-se gradativamente da tortura que sofreu para levantar-se, uma vez mais, contra seus algozes – à medida que espera o retorno de Cassius.
Em contrapartida, forças contrárias ao levante rebelde também trabalham incansavelmente a fim de defender seus interesses e sua fidelidade: Dedra (Denise Gough) e Syril (Kyle Soller), após demonstrarem a primeira faísca tênue de empatia um para o outro, se tornam improváveis aliados conforme navegam para encontrar o personagem principal e seus asseclas, desejando, mais que tudo, preencherem o vazio que insiste em acompanhá-los. Guiados por Partagaz (Anton Lesser), os subservientes ao Império entram em conflito ideológico e narrativo para vibrantes enredos que são explorados pouco a pouco ao longo de doze impecáveis episódios que nos arrebatam em uma lufada de originalidade muito aprazível e satisfatória.
Falar do trabalho do elenco parece redundante, considerando as irretocáveis performances com que nos presentearam na temporada de estreia. Porém, é perceptível como o corpo de atores e atrizes está muito mais comprometido em garantir um finale estrondoso e marcante, jogando-se de cabeça a personalidades mais intrincadas, pautando cada entrega em um narcótico espetáculo. Luna, entrando em território mais familiar, eterniza sua presença no panteão ‘Star Wars’ com uma interpretação incrível, além de garantir que a química com seus colegas – incluindo os sempre ótimos Arjona e Skarsgard – esteja ali, mas elevada à enésima potência. O’Reilly reflete o beco sem saída em que Mon Mothma se encontra, eventualmente rendendo-se ao agora e esperando que suas ações deem frutos; e Gough se imortaliza como uma das antagonistas mais bem construídas desse espectro intergaláctico ao retornar como Dedra.
Os aspectos técnicos e artísticos despontam como a cereja de um delicioso e viciante bolo: o diretor australiano Ariel Kleiman, responsável pelos seis primeiros episódios, é responsável por transformar a primeira metade da nova temporada em um obra-prima do show business, transformando o que poderia ser um simples testemunho audiovisual em uma cuidadosa peça artística que tem foco muito maior no drama e no suspense interpessoais em contraste à epopeia espacial que se dispõe à sua frente; Janus Metz e Alonso Ruizpalacios, comandando a segunda metade, fomentam o cenário postado com perfeição por Kleiman ao arquitetar catarses sinestésicas que, pouco a pouco, se despedem dos fãs.
A 2ª temporada de ‘Andor: Uma História Star Wars’ não apenas se iguala à impecável qualidade do ciclo de estreia, como o supera diversas vezes ao investir mais esforços em enredos muito bem engendrados que são delineados sem pressa, dosando ação, drama, aventura e humor de maneira soberba – e que conta com um trabalho performático de tirar o fôlego, sagrando-a uma das melhores entradas desse universo sci-fi.