Calçados: indústria brasileira prevê exportar 15% da produção em 2025

A indústria brasileira de calçados sofreu abalos nos últimos anos. O mais sentido envolveu a seção poderosa instalada no Rio Grande do Sul, atingida em cheio pela recente tragédia ambiental ocorrida no estado. Mas, felizmente, o setor se recupera com a força de ser o maior do Ocidente e quinto do mundo, atrás apenas do parque de países asiáticos. É um pilar importante da economia nacional, gera mais de um milhão de empregos diretos e indiretos e movimenta aproximadamente R$ 33 bilhões por ano, pelos cálculos da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) em 2023.

A produção no País em 2024 deverá registrar 890 milhões de pares, um aumento de mais de 3% em relação ao ano anterior. “Estimamos para 2025 uma produção de 904 milhões de pares, com cerca de 15% destinados à exportação para vários países, entre eles EUA, Argentina e Paraguai”, afirma Haroldo Ferreira, presidente da Abicalçados. Embora o consumo interno tenha aumentado 9% até setembro de 2023, a produção cresceu apenas 4,8%, deixando espaço significativo do mercado interno para produtos importados.

Haroldo Ferreira, presidente da Abicalçados, diz que a produção do Brasil em 2024 deverá registrar crescimento de 3% em relação ao ano anterior (Crédito:Divulgação)

Para proteger o setor, o governo brasileiro adotou medidas antidumping e a taxação de pequenas importações, como a chamada “taxa das blusinhas”. Desde 1º de agosto passado, a Lei 14.902/2024 estabeleceu uma alíquota de 20% para compras internacionais de até US$ 50 e 60% para valores entre US$ 50,01 e US$ 3.000. “Essa alíquota de 20% é um alívio para o setor, que já chegou a enfrentar a possibilidade de importação com tarifa zero, mas ainda não é suficiente para competir em condições iguais com a indústria brasileira, que paga muito mais impostos e tem custos de produção cerca de 40% maiores que os países asiáticos”, afirma Ferreira.

Desde 2010, as importações de calçados da China estão sujeitas a direitos antidumping, medida aplicada para evitar práticas desleais de comércio, como vender produtos no exterior a preços abaixo do mercado. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), as importações brasileiras de calçados originários da China estão sujeitas a uma tarifa antidumping de US$ 10,22 por par. Esta medida foi prorrogada em 2016 e novamente em 2022, com validade até 2027.

Eny, loja centenária de calçados em Santa Maria (RS): vendas de outubro passado tiveram alta de 19,1% em relação ao mesmo mês de 2023 (Crédito:Divulgação)

De acordo com o MDIC, a prorrogação foi baseada em evidências de que o fim das tarifas antidumping poderia levar à retomada do dumping e ao consequente dano à indústria nacional. “Constatou-se que a suspensão da medida muito provavelmente levaria à continuação do dumping e ao prejuízo à indústria doméstica”, informaram as autoridades.

Apesar da proteção, a crescente importação de calçados de países como China, Vietnã e Indonésia ainda preocupa o setor. Ferreira enfatiza que a falta de ratificação de convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) nesses países coloca a indústria nacional em desvantagem. “A China, Vietnã e Indonésia ratificaram muito menos convenções da OIT, o que afeta diretamente a competitividade de setores intensivos em mão de obra, como o de calçados”, explica.

Ferreira destaca que enquanto o Brasil tem uma certificação ESG (Origem Sustentável) exclusiva para fábricas de calçados que adotam práticas sustentáveis, muitos produtos asiáticos não seguem esses padrões ambientais e sociais, agravando a concorrência desleal.

Diretor da Kidy Calçados, Ricardo Garcia defende inovação e proteção para o mercado local (Crédito:Divulgação)

Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras, que emprega mais de 20 mil pessoas, comenta sobre a eficácia das medidas antidumping: “Quando as medidas foram aplicadas contra a China, as exportações chinesas praticamente cessaram. No entanto, os produtos continuam chegando de países como Vietnã e Indonésia. Agora, com algumas empresas chinesas recebendo isenção da tarifa, a China voltou a exportar grandes quantidades de calçados para o Brasil”. Ele acrescenta: “Mesmo com uma mão de obra altamente qualificada, o Brasil não consegue competir com os custos asiáticos. O mais importante seria a criação de condições de competição mais justas. A extensão das medidas antidumping para Vietnã e Indonésia é fundamental”.

Além da concorrência externa, o setor enfrenta desafios internosRoberto Argenta, presidente da Calçados Beira Rio, que emprega cerca de 25 mil pessoas, aponta os problemas enfrentados pela empresa em 2023: “Enfrentamos dificuldades com o aumento dos impostos, a reoneração da folha de pagamento e os juros elevados. Além disso, nossas fábricas no Vale do Taquari sofreram perdas significativas devido às enchentes no estado (Rio Grande do Sul), o que impactou a produção”. Apesar desses desafios, Argenta prevê um crescimento de 5% para 2025.

No varejo, José Carlos Ferreira de Oliveira, gerente de compras das lojas Eny, uma centenária varejista de calçados em Santa Maria (RS), observou um impacto positivo das políticas de proteção ao setor. “Em outubro de 2024, registramos um aumento de 19,1% nas vendas em comparação ao mesmo período do ano anterior”, afirma Oliveira.

Tadany Cargnin, administrador de empresas e consultor internacional, salienta a importância das tecnologias de ponta para a competitividade dos produtos asiáticos: “A China detém um grande potencial de automatização e robotização de suas indústrias, além de um ecossistema eficiente que colabora para reduzir o custo final dos produtos, tornando-os altamente competitivos. O desenvolvimento de tecnologias como Inteligência Artificial permite que as empresas produzam calçados de boa qualidade, competitivos em qualquer país”.

(Divulgação)

“Mesmo com uma mão de obra altamente qualificada, o Brasil não consegue competir com os custos asiáticos. O mais importante seria a criação de condições de competição mais justas”
Pedro Bartelle, CEO da vulcabras

Ricardo Gracia, diretor da Kidy Calçados, reforça a importância da inovação e da proteção ao mercado nacional. “Para a empresa crescer, além da busca constante por inovação, precisamos fortalecer as marcas ‘Made in Brazil’ e ampliar as medidas antidumping para países como Vietnã e Indonésia.”

Com inovação, sustentabilidade e a manutenção de políticas de defesa comercial, a indústria de calçados brasileira tem o potencial de se consolidar como um importante player global, contribuindo significativamente para a economia do País.

O post Calçados: indústria brasileira prevê exportar 15% da produção em 2025 apareceu primeiro em ISTOÉ DINHEIRO.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.